O fantástico da vida é saber que você
sempre pode se surpreender. E fui surpreendida muitas vezes nesses 8 meses que
estou como mediadora no Projeto de Extensão Livros Abertos, da Universidade de
Brasília. Quando comecei a ler e ouvir falar sobre o projeto, fiquei encantada.
Leitora voraz, não é de se espantar que a ideia de ler para crianças me
inspirasse tanto. E não deveria ser nada de outro mundo, afinal, ler livros de
crianças para crianças? Nada de novo no front, correto? Errado.
A
vida tem daqueles momentos em que estar errado é completamente deslumbrante.
Minha experiência no Livros Abertos é repleta desses momentos. Isso porque me
permite pensar em três questões: o tipo de leitura, a importância das ilustrações
nos livros e o público-alvo das publicações.
Minha experiência
prévia em leitura me ensinou que ler é simples. Você só precisa acompanhar o
que está escrito no livro, dar umas entonaçõezinhas diferenciadas para cada
personagem e a fórmula está completa. Mas o projeto me apresentou um outro tipo
de leitura, a dialógica. Eu poderia falar aqui sobre esse tipo de leitura, seus
fundamentos e estratégias, mas não é o meu foco neste momento, embora acredite
que algumas coisas devam ser ditas.
A leitura dialógica é
um novo fôlego nesse nosso modelo educacional extremamente falho. Permite que a
criança saia dessa posição cristalizada de quem não tem nada a oferecer no
processo de ensino-aprendizagem. Possibilita momentos de liberdade,
criatividade, aprendizagem e autonomia. E isso tudo é extremamente necessário
neste nosso mundo conturbado e quadradinho.
Sobre as ilustrações...
Ahhh, as ilustrações (insira aqui um olhar apaixonado, que é exatamente como me
sinto hoje com relação as ilustrações) têm todo um atrativo à parte. Desde
criança eu sempre achei que elas fossem inúteis, puramente uma distração.
Quanto menos imagem, melhor eu achava que o livro era... Afinal, bom mesmo é
livro de adulto. Com o Livros Abertos eu descobri que as ilustrações podem
contar muito mais do que as palavras escritas nas páginas de um livro. Podem
dar novos significados a essas palavras, aos eventos, aos personagens. Há todo
um universo a ser descoberto nas imagens (o Vira-Lata, de Stephen King, é um
claro exemplo sobre a importância das ilustrações para uma história).
Por fim (embora seja,
na verdade, o começo de novas possibilidades), acho importante falar sobre a
ideia clássica de que literatura infanto-juvenil se trata apenas de livros de
crianças. Aprendi com o Livros Abertos (e continuo aprendendo) que os limites
de um livro são infinitos. Há uns 2 meses a mediadora Ana Paula me fez um
convite inusitado e acabei aceitando. Começamos, então, a fazer mediações de
leitura com turmas do Ensino de Jovens e Adultos. Um público adulto e idoso em
processo de alfabetização.
Começamos um tanto
quanto receosas. E os adultos e idosos também, afinal, leitura de “livros de
crianças” para adultos não parecia ser útil. Passei por momentos iniciais de
dúvidas achando que talvez os livros escolhidos para mediação fossem infantis
demais para aquele público. E a vida me trouxe uma nova surpresa. As pessoas
realmente estavam participando, estavam trazendo suas histórias de vida para a
roda de leitura. Estavam nos mostrando que aqueles que se dispõem a ensinar
também têm muito a aprender.
O conteúdo riquíssimo
que cada contação produzia, a receptividade do público quando começaram a
entender a proposta, o engajamento... Tudo nos mostrava como a literatura
infanto-juvenil é indicada para todas as idades. E então pensamos: "Até
onde vai nossa coragem em desbravar a mediação de leitura com outros públicos?".
E assim chegamos numa turma de surdos. E foi uma das experiências mais
incríveis que eu já tive oportunidade de vivenciar (e que pode ser vista no
instagram do projeto, @livros.abertos).
Fizemos a mediação com a tradução da professora de libras e percebemos que a
leitura não tem limites e que a gente sempre pode aprender com as experiências
dos outros.
As contribuições da
leitura dialógica PARA PESSOAS DE TODAS AS IDADES estão lá: claras, gritantes.
Basta apenas se permitir conhecer novas possibilidades. Proporcionar espaço nos
quais as pessoas possam trocar conhecimentos e experiências... Permitir que
seja possível não apenas ler uma história, mas ampliá-la, vivenciá-la. E vocês?
Já redescobriram um livro hoje?