domingo, 16 de outubro de 2011

Reflexão sobre a infância

Por Katsumi Takaki
O desaparecimento da infância, de Neil Postman, caminha com o leitor por vários cenários e datas – da Grécia Antiga aos dias atuais – mostrando como a noção de infância foi e é retratada. O fato é que esse tem sido um tema muito discutido e estudado, e nunca se mostra arcaico, desatualizado. É importante ressaltar que Postman não aponta “culpados absolutos” e únicos do desaparecimento da infância, além de não oferecer soluções para o problema abordado. O autor mostra possíveis causas e evidências de que a infância está em vias de desaparecer, mas em momento algum cria uma nova receita a ser seguida para que isso não ocorra.
Na primeira parte do livro, Postman se atém à Invenção da Infância, partindo dos gregos e indo até o final do século XIX. Na Grécia, a infância não era considerada uma etapa especial, e por isso se prestava pouca atenção às crianças. Isso se reflete nas palavras que se utilizava para designar uma criança ou um jovem: pode-se dizer que elas são ambíguas, usadas para se referir a qualquer um que esteja entre a infância e a velhice. Entretanto, a educação era extremamente valorizada entre eles – apesar de a noção de escola tida pelos gregos ser diferente da que se tem nos dias atuais. O fato é que a infância não foi inventada na Grécia, mas essa cultura nos possibilitou um presságio do que ela viria a ser quando os romanos a criassem.
Os romanos, por sua vez, tiveram um olhar um pouco diferente em relação à infância. Foi quando se estabeleceu uma conexão entre o crescimento da criança e a noção de vergonha; momento esse em que os romanos acharam necessário proteger a criança, por exemplo, dos segredos do mundo dos adultos. Tais ideias viriam a se perder na Idade Média juntamente com o conceito de infância, em que a criança – aos sete anos de idade – passava a ser um adulto por já conseguir ler, ter acesso a esse conteúdo. Esse fato é muito importante, pois um mundo novo de possibilidades é aberto por meio da leitura.
Segundo Postman, o início do desaparecimento da infância ocorreu com o advento do telégrafo, em que parte do mundo dos adultos – antes segregado – ficou disponível em apenas um clique. Como o próprio autor diz “o telégrafo iniciou o processo de tornar a informação incontrolável”. Assim, as crianças passaram a ter acesso a um tipo especial de informação, antes apenas acessível aos adultos.  Essa tendência se consolidou com o surgimento da televisão e a democratização ao seu acesso: “a hierarquia da informação desmorona” (Postman, 2005, p. 92).
É inegável o fato de a televisão ser um dos meios de comunicação mais utilizados pela população – não apenas como fonte de notícia, como também de entretenimento. Postman não contrapõe a essa verdade. O problema em relação à “telinha” são os excessos cometidos pelos seus usuários, que frequentemente a elegem como melhor forma de diversão – seja em família, seja sozinho. Os anos que se decorrem entre o final do século XX até os dias atuais, são marcados por uma infância em companhia fiel da televisão. A impressão que se tem é que, em muitos lares, os pais passaram a ter papel secundário na educação, no lazer e na formação de seus filhos. A televisão eliminou a exclusividade do conteúdo do mundo dos adultos – o que rompe o limite entre a infância e a idade adulta, suas principais diferenças que a caracterizam como sendo uma ou outra.
Essa revelação rápida e igualitária também surge com a internet. As crianças são constantemente sobrecarregadas com o excesso de informação vindo dos meios de comunicação e de outros eletrônicos (vídeo-games; bonecos de ação; bonecas que falam, andam). O excesso de estímulos visuais e sonoros não é de todo acompanhado por um progresso no desenvolvimento infantil. Isso pode ser visto no contexto da leitura dialógica, em que a criança é convidada todo momento a pensar sobre a estória. Certa vez durante a leitura de Peter Pan, um contador pediu para que as crianças fechassem os olhos e imaginassem a sua própria Terra do Nunca, o lar da personagem. Quando perguntadas sobre o que estavam vendo, muitas verbalizaram um “Não sei, tia! Tá tudo escuro!”.
Os recursos disponíveis para uma “infância feliz” são bem mais do que antigamente. Entretanto, a impressão que fica é a de que as crianças estão sendo cada vez mais modeladas, tendo o padrão de comportamento dito por uma “indústria infantil”. Não há espaço para que possam criar, imaginar, serem elas mesmas – serem autênticas.  As portas do mundo estão abertas para o público infantil. Fato. Com a condição de estarem devidamente vestidos segundo a moda; não correrem, rirem ou falarem alto em seus corredores; sentarem corretamente diante da mesa; não sujarem a roupa nova que a mãe comprou; não passarem o tempo “brincando”, porque é preciso amadurecer logo; lidar com uma rotina cheia de atividades, que se dividem entre a escola/balé/inglês/natação/espanhol/ violino/aula particular/esgrima; acostumar-se a ter os pais muito ausentes, porque afinal eles querem te dar uma vida confortável. Bom, é isso crianças! Sejam bem- vindas, mas não se esqueçam de limpar os pés antes de entrarem.  Seus pais só chegam mais tarde. 

2 comentários:

All you need is blog... disse...

Obrigada pelo texto, gostei muito! Muito expressivas suas frases finais.

Katsumi disse...

Obrigada! Estava inspirada no dia em que escrevi, indignada com o que vem acontecendo com a infância. Acho que por isso consegui me expressar dessa forma! =D