Hoje, no café da manhã, meu filho de sete anos comentou repentinamente:
- Dia do escritor... Humpf... Não gosto de ler...Detesto escrever e detesto ler.
Fiquei muito espantada. De onde teria saído isso?
- Filho, tenho que gritar para você tirar o nariz dos gibis e ir tomar banho, escovar os dentes...nem comer você quer quando está lendo, que história é essa?!
- Gosto de gibis. Mas odeio ler. Pronto.
Meu Deus, pensei, será que aquela professora de minha infância estava certa? Veio-me a imagem de seu semblante severo e de sua mão ossuda retirando delicadamente um dos volumes de Asterix de minhas mãos. Será que ler quadrinhos vicia e a pessoa nunca irá ler outra coisa? Será que não devo mais concordar quando ele me pedir o último número da Turma da Mônica na banca?
- Mas filho... Isso é ler...
- Não gosto de ler.
Fiquei triste. Que estranha metamorfose havia se operado em meu filho durante a noite?
- Quer dizer que você não gosta quando lemos juntos seu volume dos contos de Andersen, à noite, antes de dormir? Não gostou quando lemos, capítulo por capítulo, A Fantástica Fábrica de Chocolate? Não vai querer continuar lendo A Mulher que Matou os Peixes???
- (com tom impaciente) Claro que gosto, mããããeeee...Claro que querooo... Mas odeio ler. E odeio escrever.
- E outro dia, que você deitou no sofá com seu livrão sobre animais e ficou um tempão lendo? E o Alice no País das Maravilhas, que curtimos tanto juntos? E... e...?
Meu filho não me respondeu mais, ocupado com coisas mais importantes do que tentar explicar o óbvio à sua mãe que aparentemente havia sofrido algum tipo de torpor cerebral matutino. Foi brincar com seu navio-pirata e me deixou sozinha em minha aflição.
Sobre a mesa, deixou para trás aquilo que, aparentemente, havia motivado sua primeira fala: numa folha de papel timbrada da escola, lia-se:
“Hoje é o dia do escritor. Leia abaixo o texto informativo sobre o ofício de escritor. Copie um dos parágrafos.”
O resto da folha estava em branco e o lápis jazia ao lado, sem ponta. Do quarto, vinham estouros de canhões e exclamações de marujos.
(Texto ficcional - Qualquer coincidência é mera semelhança).
Eileen Pfeiffer Flores