sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Aquecendo o coração com histórias e amor


     31/10 é uma data que muita criança ama. Adoram se fantasiar, sair pra pedir doce por conta do Halloween, e se divertem contando histórias aterrorizantes.
     Eu sempre gostei porque além de tudo é quando completo mais um ano de vida, e esse ano calhou de ser bem no dia da minha contação. Lemos a história “O menino, O cachorro".




     Desde que comecei a ler com os pequenos, sempre fui procurando saber histórias deles que se pareciam com os temas que líamos, e sempre falaram MUITO, muitas vezes ao mesmo tempo. Hoje não foi diferente, contaram mil histórias dos cachorros deles e misturaram com a magia do Halloween: “Tia, o meu cachorro assassinou o outro e saiu correndo com a pata na boca”.

     Além disso me perguntaram se eu não tinha medo do dia do meu aniversário.
Como eu vou ter medo quando aparecem essas criaturinhas?

 

     Bruxinhas lindas, super-heróis com poderes loucos e fantásticos me abraçaram e desejaram “Feliz aniversário, tia!”.

     O que eu acho mais mágico que isso tudo é saber que eles se envolvem com as histórias e compartilham porque gostam da troca de experiências que temos! Afinal, esse é um dos papéis que exercemos, e saber que há retorno é gratificante.


     Nesse 31/10 aqueci meu coração com histórias, beijinhos e abraços mais que maravilhosos!

Por Raylane Marina

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

A Idade das Cores

A minha proposta inicial era de ler alguns contos do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen e logo em seguida pedir para que eles desenhassem sobre a história. Não deu certo. Levei um livro de contos e mesmo explicando que o livro continha várias histórias, eles falavam que era grande demais, que continha muitas palavras e não tinha desenho. Eles amam cores e desenhos e não adianta inserir uma atividade ou outra, porque os elementos mais importantes farão falta. Um outro detalhe: eles gostam de decidir sobre o que desenhar.
Depois de duas tentativas frustradas, decidi levar um livro com cores e várias ilustrações. Deu certo. Depois levei um livro ilustrado chamado Modelo vivo: Natureza morta, de Gonzalo Cárcamo. Logo no começo disse: “Hoje vocês vão contar a história”. As respostas? “Eu não quero”; “Eu não sei ler só tenho seis anos”; “Legal” etc. O resultado? Os resultados, na verdade, foram duas histórias muito divertidas, contada tanto pelos que, inicialmente, gostaram da ideia quanto pelos que disseram que não contariam, ou pelos que falaram que não sabiam ler.
Idade dos alunos: 5 e 6 anos


Faço agora uma pequena descrição das histórias:

1º grupo
Deram o nome de João Vitor ao pintor e João Pedro ao caçador. Segundo eles, o pintor observava um urso e depois veio um caçador que matou o urso. Eles se assustaram com uma figura que mostrava apenas o rosto do caçador e o reflexo de seus óculos. Em certos momentos confundiram os dois personagens, pois eram muito semelhantes fisicamente. Chegaram a conclusão de que as pessoas destruíam tudo o que o pintor desenhava e por isso ele deixou o quadro que pintava para trás.

2º grupo
Deram o nome de Marcos Rafael ao pintor e Max Max (lê-se Méx Máx) ao caçador. Nome composto porque cada um citou um nome e Max Max devido à dúvida de pronúncia. Em relação a figura que mostrava apenas o rosto do caçador e o reflexo dos seus óculos, chegaram a conclusão que ele observava um animal. De acordo com eles, o pintor se escondia e observava um urso grande e mau, mas os ursos não são apenas maus. Eles também são bonitos e fofinhos. Os personagens tinham cara de pepino e eram neto e avô. O caçador era avô porque tinha o cabelo loiro ou branco. Não chegamos a uma conclusão. No final o pintor abandonou o quadro que pintava porque estava cansado de pintar.


Por Elioenay Melo 

domingo, 19 de outubro de 2014

Diário do Contador: Mundo de sombras: O nascimento do Vampiro- Ivanir Calado.

         A minha experiência com o livro Mundo de sombras: O nascimento do Vampiro começou na adolescência. O que mais me fascinou foi a trama de suspense e a linguagem de adolescente tão similar à que eu estava acostumada. As vivências narradas pelo autor se aproximavam da minha realidade de cidade do interior. Algo que me chamou a atenção foi o fato do autor escrever a história com um pano de fundo de sua infância. Li este livro três vezes, tamanha foi a minha afeição por essa obra, principalmente pelos trechos marcantes que possuíam um correlato forte com minhas experiências, não literalmente, mas em parte uma vivência um tanto próxima. 

          Foi pensando nestes momentos que decidi lê-lo com as crianças, principalmente pelo caráter de suspense e terror que o livro possui. O mistério que cerca a história certamente prende o leitor, que simplesmente embarca com Júlio e Daniel nessa busca pelo vampiro. No primeiro capítulo já percebi diferenças contrastantes entre a minha leitura e a compartilhada com as crianças. A linguagem do Autor é peculiar, pois Calado emprega gírias dos anos 70, palavras muito pouco usuais como “desvario gótico”, “estarrecido”, “mausoléu”, “bulhufas”, “pinel”, entre outras. Coube a mim, decifrá-las para as crianças, muitas nem eu sabia o significado, tive de recorrer ao dicionário. 
          
        Uma das razões é que essas palavras não fazem parte da realidade das crianças, nem faziam parte da minha, mas por já estar acostumada com diferentes tipos de escrita de diversos autores e autoras, quando o li não dei muita importância, mas agora lendo com as crianças, elas me fizerem perceber que certas coisas simples de explicar são escritas de maneira tão complexa que se torna incompreensível. No entanto, o mistério é tão envolvente que esse detalhe ficou para o segundo plano, muitas crianças já relataram estarem interessadíssimas em descobrir quem é o Vampiro. Outras já estão buscando mais livros nesse sentido e eu fico extasiada de ver esse resultado. Muitas já especulam sobre os próximos acontecimentos e tenho que me segurar para não ultrapassar a história.            
       Um menino em especial sempre me questiona a respeito do título, pois se trata do nascimento de um vampiro, mas até o momento só houve a morte de uma vampira. Claro que essa é uma das revelações do livro, não posso nem pensar em adiantar. 
        
      Tenho percebido que quando perpassamos partes do livro que tratam da morte e abordo esse assunto com as crianças, têm surgido definições e perspectivas sobre esse fenômeno que demonstram o interesse delas em compreendê-lo. Apesar da pouca idade (alunos do 4º ano), eles relatam já terem ido a muitos enterros e passado por situações de angústias profundas, marcantes que já influenciou o olhar que eles têm sobre a vida. Algumas relataram temer e ao mesmo tempo ter curiosidade sobre a morte. Acho bacana ver como as experiências delas já demarcam suas crenças e como elas também estão muito abertas a conhecer e discutir sobre essa temática tão desafiadora como é o fim da vida.
      
    Enfim, este é apenas mais um relato do quanto nós, Mediadores, estamos continuamente aprendendo com as crianças, essa é mais do que uma relação de leitura, é uma troca entre as crianças, o livro e os Mediadores. 



Editora: Galera Record
Autor: Ivanir Calado


Texto por Sara Meneses.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

As histórias em quadrinho e o desafio das diferenças culturais na literatura infantil

“Então você pretende abordar história em quadrinhos? Acho uma excelente ideia!”

Foi o apoio que minha coordenadora deu enquanto discutíamos o que eu idealizava para o projeto.

Como estudante de Letras Japonês, minha paixão por HQ queima desde criança. Acredito que minha iniciação para a leitura se deve aos quadrinhos, inclusive, foi a obra do Maurício de Sousa “Turma da Mônica” que me incentivou à alfabetização; eu realmente tinha inveja da minha irmã mais velha ao vê-la se aventurar nos quadros com belas figuras enquanto eu tentava acompanhar a história apenas visualizando as cenas. Defendo que entre tantas obras literárias, existam riquíssimos trabalhos que provavelmente as crianças não terão acesso na escola, talvez nem na vida cotidiana já que infelizmente existe um preconceito com esta literatura em particular. Uns acreditam que é infantil demais – apesar de existirem quadrinhos adultos aos quilos na banca de jornal -, outros que frases curtas – mesmo que com um contexto dependente de ligações entre todas as frases e imagens – não ajudam a treinar leitura, chegam a comparar com filmes legendado e conversas em chats. Baseando-me nisso, senti a obrigação de apresentar a riqueza deste trabalho no projeto em que me inscrevi.

Apesar de a Turma da Mônica ter iniciado a minha vida como leitora, o HQ que mais me marcou foi o mangá japonês Naruto.



Com um protagonista atrapalhado, socialmente marginalizado; longe de ter as qualidades clichês de um herói, Naruto Uzumaki é um ninja da aldeia da folha que carrega um sonho: quer ser reconhecido e respeitado por todos. Ele se esforça como pessoa, trabalha duro a cada dia, tem coragem e nunca volta atrás da sua palavra; esses são seus pontos fortes. Em contrapartida, não tem nenhum talento como ninja e possui um segredo considerado tabu social que todos sabem, menos ele.

Seu grande rival, mas não um antagonista, seria como protagonista secundário, e melhor amigo Sasuke Uchiha tem muito talento, nasceu em um clã poderoso que ajudou na construção da vila e carrega a herança genética do Sharingan (um jutsu* ocular antigo que permite um poder superior em campo de batalha), logo é idolatrado por todos os cidadãos apenas por seu um Uchiha. Todavia, Sasuke possui uma ambição por causa da sua trágica história no passado, está disposto a fazer de tudo por vingança, isso também inclui passar por cima das pessoas que Naruto deseja proteger.

Através das aventuras desses dois ninjas super contrastantes dentro da Equipe 7(formada por mais dois personagens Sakura Haruno e o líder Kakashi Hatake e tardiamente Sai – na saída de Sasuke), a cada capítulo uma nova lição de superação é formulada, reflexões puramente humanas do que é a vida ainda que em um contexto fantástico no mundo Ninja criado por Musashi Kishimoto. Aqui no Brasil, a primeira saga de Naruto(conhecida como Naruto clássico por abordar apenas a infância do jovem) é classificada para 10 anos(na tv aberta), idade adequada para trabalhar no projeto. Entretanto, essa valiosíssima história é uma opção descartada por muitos educadores, e não é bem por sem quadrinho. Mas afinal, qual é o problema de trabalhar com essa obra?

O segredo de Naruto.



Não muito tarde nos é revelado, ainda no primeiro capítulo do primeiro mangá tudo se esclarece. Uzumaki Naruto carrega em si uma besta, um demônio mitológico japonês chamado “Kyuubi” ou “Raposa de nove caudas” que só lhe foi selado no interior para que ele proteja a vila.

Diferente da nossa cultura ocidental cristã, demônios e anjos possuem uma conceituação diferente no Japão. Para nós ocidentais (culturalmente falando) o mundo está dividido entre “o bem e o mal”, sendo o mal desprezível e o bem única coisa que devemos alcançar; logo demônios são ruins e anjos são bons.

No oriente, essa dualidade também existe, mas em visões diferentes. Para a subcultura taoísta – a utilizada como base da cultura no universo fictício de Kishimoto – o Yin e Yang não são exatamente “bem e mal”, mas todos os opostos como “luz e trevas”, “feminino masculino”, “princípio e fim”, e ambos são puramente necessários para manter o equilíbrio universal.

Neste mundo fantástico, o universo é constituído por uma energia vital que se dividiu em nove Bijus(monstros com caldas), ou seja, são seres que mantém o equilíbrio universal, só receberam o nome “demônio” ou “besta” por serem usadas como armas que ninjas forasteiros inventaram em busca de poder. Em outras palavras, o demônio de Naruto não é o espiritual cristão que conhecemos, não são anjos que desobedeceram a Deus e trabalham para o Diabo, recebe esse título por motivos diferentes; apesar de ambos serem mal nomeados, estão totalmente desvinculados conceitualmente.

O desafio da abordagem é: como apresentar a história sem causar alvoroço entre os pequenos ou maus olhos dos pais? Explicar seria uma boa opção? Por um lado, praticamente ninguém vai ouvir porque explicações em decorrer de histórias quebram o sentimento de aventura, e tirar a atenção ou desinteressar alguém é a ultima coisa que quero fazer. Também tem o fato de talvez não entenderem a explicação, já que até mesmo alguns adultos que acreditam na doutrina não sabem conceituar o que seria um demônio, mas sabem que é ruim porque ouviram na igreja.

Explicar antes de começar a história além de causar uma impressão ruim – como já citado – também contribui com spoil, pois eu estaria quebrando um segredo (ainda que revelado no 1° capítulo do mangá). Apesar dos desafios, mostrar culturas diferentes das nossas no universo infantil contribui no combate a intolerância e espanta a ignorância com o conhecimento. Sem contar que Naruto é uma obra linda e revolucionária no universo infantil ocidental puramente Disney, já que raras são as vezes que o herói nos concedido não é o talentoso da história, mas o fracassado.

Texto por Amanda Barros
Revisão por Eileen Flores

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Mudanças e Descobertas

Um conto da autora Aiko Hime(eu) em homenagem aos professores.
Audra é um pseudônimo artístico da minha antiga professora de artes. Atualmente ela não leciona, mas será eternamente professora, minha professora.





Crédito da arte Michele Tattoo

Mudanças e descobertas

Com ela, inicialmente, o poder de raciocínio fluiu. Não era como resolver os deveres de matemática em que tinha uma fórmula pronta para tudo, ou uma aula de história na qual o livro tudo dizia - na cabeça deles, é claro. Ela incentivou o poder de refletir e questionar naqueles cérebros completamente mecanizados por um sistema de ensino que até então era... Chato. Artes tornou-se a matéria favorita.
Ela não era apenas uma professora, Audra sabia se comportar como um ser humano, tratava as aulas de seus alunos não como suas obrigações, mas como seus direitos; eles eram pessoas com uma vida, como ela. Fazia questão de mostrar a todos que não era a mais sábia, nem estava sendo paga para transmitir conhecimento; recebia com a finalidade de aprender juntamente com todos, iniciando debates propostos por livros e fontes pesquisados por cada aluno presente. Quando um tema era levantado por ela, difícil algum aluno, ou qualquer outro cargo estudantil, derrubar.
Começou a dar aulas de teatro e desenho incentivando atividades extracurriculares. Pela primeira vez em cinco anos, a escola tinha algo produtivo a oferecer para aquela gente.
Ela gostava de filmes, livros e quadrinhos; a cultura brasileira a encantava, nada daquele falso patriotismo, ela realmente amava o que sua rica cultura oferecia. Através da sua sincera adoração, pensamentos eurocêntricos entre outros alvos de consumo selvagens capitalistas foram quebrados; sabia que os Estados Unidos não são os únicos a produzirem cultura? Questionava a globalização que aproximava a cada dia todas as culturas em uma só, perdendo tesouros culturais de forma obrigatória.
Apaixonada por ensinar, ofereceu-se para tutelar as aulas de reforço dadas na escola. Proposta como clubes culturais de incentivo à educação fora da sala de aula nunca foi tão bem sucedida. Audra transformou um espaço de notas, trabalhos e pressão em um local de produção, criação e discussão. Crianças robôs em humanos pensadores.
Um dia uma aluna entrou em sua sala por engano e espantou-se com o que viu. Audra estava passando por uma metamorfose dolorosa. Suas costas com cavidades despejando sangue, seus lábios conjuravam palavras inaudíveis, mas ainda sim os vidros em volta se quebravam, a dor estava mesmo insuportável. Mais perto, a estudante com medo se aproximava para saber o que acontecia. Nos buracos que sangravam havia duas películas, mas não pareciam lâminas ou coisa assim, estavam saindo, literalmente de dentro pra fora.
A aluna, sem saber o que fazer, apenas catou os lenços que encontrara na gaveta e passou a tentar estancar aquele vulcão em erupção sanguinolenta. Tocando as costas, reparou que eram asas, tinha asas saindo do corpo da professora.  - Mas que metamorfose era essa? -  a aluna pensou.
Procurando no fundo de seu cérebro, a biologia do homosapiens não permitia o nascimento de asa, não fazia parte da constituição humana. Imaginou que talvez fosse uma doença, ou que Audra fosse uma aberração da natureza. Independente do que fosse, a aluna tentaria ajudar a amada professora da forma que fosse mais conveniente para ambas.
Foram quatro horas de dor para as asas se expelirem, a professora estava fraca, totalmente largada no chão, com apenas a cabeça no colo da aluna que presenciava aquela cena de tensão até o fim. Quando finalmente fora, as asas começaram a brilhar, era um tom verde florescente; os cabelos da professora mudaram de cor, agora eram laranja e moldaram um penteado perfeito, a pele de Audra estava viscosa, sem vida pela quantidade de sangue que perdeu, mas um fleche de luz dourada começou a cobri-la inteira. Quando no fim, as íris e pupila sumiram. Audra estava gelada. A aluna chorou, sua amada professora estava morta.
Crente que a metamorfose tinha sido um fracasso, criou coragem para pedir ajuda. Gritava aos três ventos a sua dor, o que seria daquela escola sem Audra e o que seria sua vida sem a própria vida? Formou uma multidão.
No aposento, nada se encontrava, Audra tinha sumido. Seria fruto da imaginação fértil da aluna? Todos se foram zangados. A menina não entendia, procurou a professora em todos os cantos da escola, mas ela realmente tinha sumido.
Depois de uma semana, todas as aulas voltaram a ser como antes, apenas obrigações, decorar não questionar, essa era a lei do sistema. Temos de buscar o sucesso através da profissão, não buscar ser um bom profissional para o sucesso os perseguir, isso era fantasia. Ora, mas fadas também não eram fantasia?
Neste devaneio, um bilhete cai em sua mesa. A caligrafia era conhecida, mas inacreditável. “Agora é a sua vez”, estava anônimo, mas o remetente vinha de um mundo aparentemente imaginário, que, como a educação proposta por Audra, se antes era fantástico agora passa a existir. Porque essa aluna vai fazer existir.
Suas costas começaram a doer, a dor nunca foi tão bom sinal.
Isa nunca mais veria Audra, mas se tornaria próxima de alguém como ela. Mudanças e descobertas não poderiam ser melhores.

sábado, 11 de outubro de 2014

Muito além de vampiros e bananas

Neste Dia da Criança, vamos olhar além da prateleira rosa e azul?


A capa não te chama com dragões, princesas nem jogos mortais. Não é cheia de cores nem de letras chamativas. O livro estava perdido na prateleira e acho que ninguém o havia sequer notado. Como um simples pedaço de cerâmica.


"O que pode haver de interessante numa história com um título desses? "

"Um pedaço de cerâmica"? Pensa-se num um caco, algo descartável... 
Descartável, assim como o garoto Orelha-de-Pau, que só tem direito a um "nome de órfão" e mora debaixo da ponte com o homem-garça, indigente que o adotou desde pequeno. 
Orelha-de-Pau conhece bem o lixo de cada casa da aldeia de Ch´ulp´o, na Coréia do Século XII.  Descobriu que, por ser órfão, criança e morar na rua, é invisível para os adultos. Por meio das mudanças sazonais do lixo de cada casa e das conversas dos que o ignoram, sabe muito sobre a fama dos ceramistas de sua cidade, peritos na fabricação de peças com a técnica do esmalte Celadon*. Conhece também suas rivalidades. Sabe dos altos e baixos nas encomendas que vêm de palácios longínquos.  
Orelha-de-pau tem um segredo: todos os dias, interrompe sua busca por restos de alimentos para observar, escondido, as atividades de Min, o melhor ceramista das redondezas, conhecido por suas obras de tirar o fôlego, mas também por seu mau humor e seu silêncio taciturno. A magia das formas dos vasos que surgem no torno faz com que Orelha-de-Pau até se esqueça de sua fome.
Mas a história começa mesmo no dia em que Orelha-de-Pau não resiste à tentação e invade a casa de Min para ver de perto as obras verdes-como-jade.

Se você acha que tudo terá um desfecho fácil e previsível, está muito enganada(o). 
Uma narrativa encantadora que faz pensar sobre viver à margem e sobre o valor da solidariedade, a dor das perdas e o difícil caminho do crescimento.


Que tal sair da mesmice  Dia da Criança, que também é o Dia Nacional da Leitura, e presentear as crianças que você ama compartilhando esta história maravilhosa?
Recomendamos!

Tradutor: Eneida Vieira Santos.
Editora: Martins Fontes
Obra vencedora da Newbery Medal.
Parte do acervo PNBE 2009.
Idade recomendada: aproximadamente 10 anos 
(Para leitores que já possuem mais autonomia na leitura, sendo que a idade poderá variar).





*Celadon: um esmalte bastante conceituado na história da cerâmica. Seu principal elemento corante é o óxido de ferro, responsável pelo matiz verde, cinza ou azul em vários tons.




sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Crianças: O presente futuro e o presente bem presente

 
Imagem extraída de: http://www.educacao.al.gov.br/comunicacao/sala-de-imprensa/noticias/
2012/maio/alagoas-recebera-novo-material-didatico-para-alfabetizacao-de-criancas

Além de sentir-se humanizada e ter injeções de esperança ao estar em contato direto com as crianças no projeto Livros Abertos, as reuniões semanais de equipe são um ambiente interessante de interação do grupo e de compartilhamento de experiências, conselhos e questionamentos.

Preciso admitir que a leitura dialógica é um campo bastante desconhecido para mim, pois sempre fui contadora de histórias para ouvintes; é tudo muito novo quando as próprias crianças interpretam e montam juntas o significado da história.

No intuito de promover um ambiente livre de barreiras para o questionamento e a interação das crianças com o livro e as questões que dele advêm, a ideia do projeto oferece uma infinidade de possibilidades que a própria criança protagoniza.

Muito além da ideia tradicional de ensino, a leitura dialógica transcende padrões convencionais. De fato, nosso projeto trabalha com o ensino; o objetivo ali é ensinar apenas o que concerne à abertura de mente, ao desenvolvimento do senso crítica e à interpretação do texto, com perguntas frequentemente direcionadas pelas próprias crianças.

Reitero, então, a diferença: a criança como protagonista.

Em nossas reuniões semanais, sou instada a sair da caixinha mental de ver os pequenos como “páginas brancas” com muito a aprender. A este pensamento é acrescida a ideia de que eles também têm muito a ensinar. “Deixe a criança te guiar” e quebre todos os seus paradigmas.

Surpreendo-me com a riqueza das observações dos pequenos, que enxergam muito além do que nossas próprias ideias pré-concebidas. Daí lembramo-nos que as nossas ideias um dia não estavam ali; um dia eu era justamente como eles, livre para não descartar os pensamentos “fora do limite do razoável” que viessem a mim.

E ao abrir-me para esses pequenos e para os livros cheios de ideias fantasiosas que há muito não povoam minha mente, abro-me também para a realidade que não há futuro sem presente. E que essas crianças são hoje o que serão, são hoje o que estão se tornando. Despojo-me de qualquer ideia messiânica de ajudar, igualo-me aos pequenos e vejo que eles não são o futuro do país, mas o presente bem presente, que molda também a mim.

Deborah C. R. Ribeiro.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Sobre a reunião passada...

Não é uma oficina, nem dicas, nem um workshop, nem uma to do list para você ser o escritor perfeito, mas eu gostaria de colocar (parte) o que eu estava pensando na nossa última reunião...

Primeiro eu gostaria de dizer que eu fui autodiagnosticado com dislexia, uma bem especifica. A minha cabeça não consegue transmitir a informação para a minha boca, nem para os meus dedos. O que eu penso na maioria das vezes não possui ordem nenhuma, acho muito difícil traduzir minhas ideias em palavras, e tentar colocar elas no papel só me confundem mais ainda.

Mas sabe que eu até que gosto de escrever aqui... (falta a disciplina para sempre escrever no meu dia, mas a Eileen perdoa) Acho bacana compartilhar esses pequenos textos com vocês que leem. Quem sabe dá para aprender algo ou aquele sentimento que dá quando a pessoa que escreve diz exatamente o que você está pensando e eu imagino se ela me conhece ou não, porque ela disse exatamente tudo.

O tema é (leitura, pelo menos eu acho) sempre o mesmo, mas sabe que eu acho impossível repetir. A gente como mediador tem experiências tão diferentes, com nossa turma, com as crianças, com o livro que a gente está lendo, e também nossa experiência com o mundo, mediada por nós, através das nossas experiências, traumas, preferencias, memorias, e tantos outros fatores que nos fazem únicos.

Eu não sei mediador o que se passa nessa sua linda cabecinha, eu não sei como fazer você sentir que aqui e um espaço seguro, eu posso até estar sendo (gerundismo??) um pouco pedante nesse texto todo, mas eu gostaria que você tentasse, confia em mim, deixa a gente saber como é complicado a sua cabeça e como vai ser engraçado tentar entende-la.



Não é forçado a participar, e se você estiver muito nervoso para apertar esse botão PUBLICAR,  pensa que eu, sou um dos, se não o único, que recebeu uma correção da Eileen no post, depois que ele já estava no blog.  (no hard feelings Eileen)

BoscoJoao ;D

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Armillaria bulbosa (Diário do Contador)

"Armillaria bulbosa? Tio, que nome estranho! Isso é remédio?"


Você deve estar se perguntando a mesma coisa! Bem, continuamos a passear pelos cinco ramos da árvore da vida. Passamos pelo reino Monera e aprendemos o quão importante são as bactérias para a vida na Terra e que as cianobactérias não são apenas as bactérias mais antigas do mundo, mas que elas foram responsáveis pela criação do oxigênio, permitindo assim a existência de outras vidas em nosso planeta.

Na contação seguinte, levei algumas imagens para ilustrar ainda mais tais informações e propus uma atividade na qual as crianças do 5º ano B poderiam treinar desenho de observação ou mesmo criar, a partir dos modelos, suas próprias bactérias. Em sua maioria, preferiram observar os modelos, o que também é algo muito bom, pois, na observação, têm a oportunidade de analisar os detalhes de cada espécie.


O reino dos Fungos é o segundo ramo da árvore. Ao começar a leitura, logo fui advertido de que havia combinado que eles iriam ler, e não eu. Gostei muito da atitude e de ver o quão interessados estão em aprender sobre tal assunto. Sâmila, aluna do meu primeiro grupo, começou a leitura, e todos ficaram perplexos em saber que ingerem fungos diariamente, pois, quando comem um pedaço de pão, estão comendo levedura, que nada mais é do que uma espécie de fungo. E que numa floresta, as bilhões de folhas que caem das árvores são trituradas pelos fungos e bactérias, que as absorvem como alimento.

Uma das imagens e seu nome esquisito chamaram a atenção de Sâmila: Armillaria bulbosa. "Mas por que colocaram um nome tão estranho, tio? Isso, para mim, é um cogumelo!" Então expliquei a eles que todas as espécies que os cientistas estudam possuem nomes científicos diferentes dos que conhecemos, pois os ajudam a classificá-las melhor. Foi então que Sâmila leu algo que deixou todos chocados! "Gente, escutem isso! Esse fungo tem mil e quinhentos anos! E é mais pesado que um elefante!" Todos ficaram ainda mais atentos, observando as ilustrações do livro. Nesse momento, atinei que consegui, de fato, fazê-las se envolver com a leitura e reconhecer que ela é uma viagem prazerosa. É verdade que, com o passar do tempo, pode-se achar o contrário, pois crescemos, e a leitura acadêmica se torna prioridade. Temos de ler e estudar coisas superchatas para concurso e atender "obrigações" que a vida nos impõe.

Espero estar ajudando a criar esse prazer da leitura dialógica versus arte-educação, e a cada dia percebo que sim! Reino após reino, temos produzido desenhos e pinturas para ilustrar nossa leitura e nosso aprendizado. Montarei com cada aluno um portfólio com suas obras, que serão expostas para os demais colegas de classe e que também serão levadas ao Projeto para apreciação de todos.

Por Sille Maciel

sábado, 4 de outubro de 2014

Sobre se sentir um bicho estranho

Eloísa e os Bichos: 7 dicas de mediação de leitura

Para bibliotecários, educadores, psicólogos, familiares e quem mais quiser compartilhar um momento maravilhoso de leitura.


Eloísa e os bichos
texto: Jairo Buitrago
ilustrações: Rafael Yockteng
tradução: Márcia Leite

Editora: Pulo do Gato


Quem nunca se sentiu um bicho estranho?
Quem nunca se sentiu o perfeito "bicho estranho" ao conviver com um novo grupo, uma nova escola, um novo bairro, cidade ou país? Quem nunca se sentiu esquisito(a), desajeitado(a), exótico(a)? Literal e figurativamente perdido(a)?

Pense numa história que, por meio de uma sinergia perfeita entre texto e imagem, capta, sem nunca dizer isso diretamente e com grande beleza, essa experiência. Essa história é a premiada Eloisa e os Bichos. O resumo está disponível aqui, se quiser saber um pouco mais da história. Mas nós gostaríamos de lhe dar algumas dicas de mediação:


1) Curta o livro antes, sozinho(a).  Tome nota (mental ou no papel, mesmo) de suas reações. Você gostou? Do que gostou? Por que gostou? (Isso pode ser difícil dizer, mas é importante. Precisamos saber dizer por que as obras nos agradam ou não se quisermos ser bons mediadores.

2)  Todo mundo já foi um bicho estranho alguma vez em sua vida!  Ainda em sua leitura prévia, pergunte-se: que experiências minhas isso me lembra? (Algumas podem ter sido muito recentes!) Leia sobre os autores e pense também sobre as experiências deles que podem ter contribuído para sua grande sensibilidade perante o tema da imigração, da alteridade e da adaptação a mundos diferentes.

3) Observe bem as imagens e faça sua leitura. Anote o que lhe chama a atenção. Por exemplo, a mim, pessoalmente, estas foram três das coisas que me impressionaram:
      a) Compare as fotos ilustradas no início e no final. Você notou as diferenças?
      b) Quem está arrumando as fotos? Que momentos cada uma retrata? Como elas completam a história, por um lado, mas criam novas perguntas, por outro? 



As imagens não só respondem, mas também lançam novas perguntas..
      c) Há um urso caído no asfalto que aparece na primeira página... Compare com a página seguinte - o que está acontecendo? E ao final, como aparece a cena? Como isso se relaciona com o processo todo que ocorre com Eloisa e seu pai?

Isso me chamou muito a atenção e me remeteu a várias coisas, inclusive a simbologia do urso de pelúcia como objeto de transição, que nos dá segurança em momentos de separação e crescimento.


Obs. A idéia NÃO é que você leve  suas impressões prontas para expô-las durante a leitura ou impô-las crianças. A idéia é que se deter e refletir durante sua leitura prévia ajudará a responder aos questionamentos e comentários das crianças de modo muito mais rico e instigante.

4) As frases são muito curtas e enxutas e, por isso mesmo, há o risco de fazer a leitura de modo mecânico se você não se ouvir lendo antes. Treine sua leitura antes em casa, várias vezes. Ouça o fluxo, o ritmo, a entonação, a musicalidade de sua voz. 

 5) Quando for compartilhar o livro com as crianças, sente-se de modo a que todo(a)s possam ver as páginas com facilidade. Após a primeira leitura, volte com as crianças às imagens e dê a oportunidade a elas de escolherem suas cenas favoritas, explorarem as imagens e comentarem, se quiserem.
   a) Se as crianças ficarem muito presas a objetos ou aspectos isolados ("Olha a barata!", "Olha a borboleta!", encoraje-as também a fazerem uma leitura mais ampla: "O que está acontecendo aqui?" Ajude-as no processo de descrição da cena.
   b) Aprofunde e passe do plano dos fatos para o plano psicológico : "Como Eloísa parece estar se sentindo? E o pai dela?"  "Vocês já estiveram numa situação parecida/já se sentiram assim?" (não é preciso que contem, é apenas para instigá-los).

6) A obra é linda e ajuda a criança a elaborar o estranhamento, a alteridade, o novo e a separação. Mas faz isso tão bem justamente porque conta muitas coisas pelo que não diz. Durante suas leituras prévias, explore as alusões, aquilo que é deixado em aberto, aquilo que se pode ler nos diálogos que se tecem entre imagem e texto. Porém, siga a dica 7 quando for interagir com as crianças:

7) Faça perguntas amplas e abertas. Não "entregue o gabarito" (pois ele nem existe). Muitas vezes, queremos "fechar" alguma mensagem ou alguma conclusão com as crianças. Isso irá estragar completamente a leitura. Deixe as crianças se expressarem. Quando elas assim fizerem, siga o interesse delas, fazendo novas perguntas, sempre abertas, mas que as ajudem a elaborar o que estão pensando e sentindo.
Uma história que conta também (ou principalmente) por meio daquilo que fica sem dizer.


sexta-feira, 3 de outubro de 2014

A Filha da Vendedora de Crisântemos (Dica de leitura - Acervo PNBE)


Esta é a cor bonina, de que Beatriz tanto gosta. É também a cor de suas sandálias e da capa do livro.

Autora: Stella Maria Rezende
Ilustrações: Andréia Resende.
Editora: Paulus
Ano: 2008
PNBE 2011

 Beatriz, uma adolescente alegre e cheia de vida, depara-se de repente com o desprezo e o afastamento de amigos da pequena cidade mineira onde vive:
- Beatriz, vê se me esquece, viu?
- Hem...?
- Tira o meu nome do seu caderno de recordação.
- Lélio, você...
- Acha que eu preciso dizer mais coisa?
- Não é possível...
- Me poupa, Beatriz. 
(...)
Desde o amado Lélio, até a amiga Joana, que nunca mais disse "Béa, nossa amizade vale ouro", todo mundo olha para o outro lado quando vê a Beatriz. E, nessa hora, nem suas sandálias boninas* parecem ajudar. A menina alegre, que anuncia à mãe que vai sair para "vesperar"** o passeio festivo do dia seguinte, se vê de repente à véspera... da tristeza. 

Porque a tristeza sempre vem.

Aos poucos, fica claro o que parece estar incomodando a todos:
Sua mãe, que vive de vender crisântemos para um moço que vem de Belo Horizonte.
Sua mãe, que prefere ser feliz.
Isso as pessoas não vão admitir. Onde já se viu? Essazinha aí vive de brisa... Essa, aquela... Ninguém mais chama a mãe pelo nome: Dona Geralda. 
A mãe que não faz questão de marido.
A mãe que namora o moço que vem buscar os crisântemos e que, ainda por cima, é lindo de morrer.
Aí não dá.
 "Onde já se viu uma mulher assim tão aliviada de vicissitude, ara mas tá. Ela pensa que pode plantar o que quiser, o quanto quiser e namorar um homem e ser feliz e para completar o homem é lindo?"

Sinais que Beatriz não notava antes, no meio da alegria e das cores das flores, revelam-se. A música preferida cuja letra a mãe, desolada, não consegue lembrar. A água que derrama perante o olhar vazio. O telhado nunca mais consertado.

E o não dito que rodeia tudo...
Por que o pai de Beatriz foi embora tão de repente, anos atrás? Por que ninguém explica nada?

Mas mesmo na tristeza e na véspera do desespero, Beatriz não vai desistir. Se até a Assombração da Lamparina, na velha casa abandonada, ela enfrentou, não é esse não-dizer  que  vai intimidá-la nem impedí-la de descobrir o que está acontecendo e enfrentar de frente o preconceito.

Uma bela história, repleta de brincadeiras com a palavra e a poesia, que faz pensar sobre  intolerância, coragem e transformação.

Recomendamos!


* Cor de uma flor muito comum em minas, um tom de rosa-violeta muito especial.
** Mistura de véspera e esperar, palavra inventada por Beatriz depois de ouvir a tia sempre repetir que "O melhor da festa é a véspera".