segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O feriado sem nome, de Shaun Tan (Diário do contador)

Estamos chegando ao fim de um ano letivo, e as crianças da minha turminha fizeram um pedido especial, uma história sobre o natal. Lá fui eu procurar contos natalinos... mas naqueles que eu achei faltava magia e mistério, faltava poesia.

Foi então que me lembrei do conto de Shaun Tan, que compõe sua obra Contos de lugares distantes. O feriado sem nome era mágico e misterioso, tudo que as crianças tinham pedido, com exceção de um detalhe, trata-se de um natal às avessas.

Shaun conta que há um feriado que ninguém conhece a origem, mas que todos esperam com ansiedade essa solenidade, que pode acontecer em agosto ou em outubro. O ritual se inicia quando a pessoa separa seus bens mais valiosos e pelo que tem mais apreço, desses tesouros ela tem que escolher um, justamente o mais amado. Fazendo essa escolha a pessoa tem que levar seu tesouro para o telhado e o deixar ali, ao lado da antena de tv, que foi previamente decorada com coisas brilhantes. 

O resto da festividade consiste em esperar ansiosamente, até que ela chegue na calada da noite.
Trata-se de uma graciosa rena, que escolhe dentre aqueles objetos tão amados aqueles que farão mais falta, ela então os prende em sua galhada e salta silenciosa, desaparecendo noite a fora.

O que afinal ela faz com aquele tesouro? “Ela dá para alguém que precisa, tia”, ”ela ajuda o papai noel!”. No fundo, ninguém conhece este mistério.

Perguntei para as crianças qual objeto precioso elas escolheriam, pedi que elas desenhassem para que eu pudesse deixar no telhado lá de casa.

 Desapego é algo bem curioso. Entre desenhar e pensar no objeto, surgia uma grande confusão “vou esconder minha boneca embaixo da cama do meu irmão”, “mas é só uma lenda, né, tia?”, “eu só vou dar o desenho, né?”.

O patinete e mais um presente no telhado, uma boneca com seu balão
 Houve aqueles que deram boneca e patinete. Houve aqueles que a presentearam com arco-íris e seu elefante imaginário.
A filhote de elefante Júlia (será uma indireta?) e um magnífico arco-íris

 Houve uma criança que não queria de jeito nenhum entregar algo que fosse seu, ofereceu ursinhos das irmãs e até mesmo um diário, lá pelas tantas concordou em deixar seu caderno de segredos e seu celular no telhado, mas com duas condições. Eles estariam escondidos dentro da caixa e ela desenharia uma chave falsa, para que a rena não lesse seus segredos.
O livro de segredos (com uma chave falsa) e um celular escondidos

 Eu entrei na brincadeira, e ofereci inicialmente como bem mais precioso um livro do mesmo autor A árvore vermelha, mas ao ver as crianças quebrando as pontas, mordendo e brincando com meus lápis de cor, vi que precisava deixá-los no telhado também.
Impossível não entrar na brincadeira

 Houve declarações de carinho e admiração! Uma das meninas presentou a rena com um bolo de aniversário de várias cores e tamanhos. Um dos meninos da turma, que havia já participado da outra contação sentou com a gente e perguntou o que fazíamos. Eu disse que estávamos fazendo presentes para a Rena e expliquei sua história. Ele pediu para deixar um presente para ela.
O Zoíudo – um pinguim de pelúcia cor de rosa – foi o presente que ele quis dar para ela. Inicialmente, ele disse que pediria para o papai noel dois bonecos iguais, por uma questão de logística ele mudou de ideia, mandou o desenho com uma cartinha para a rena.
Rena em sua festa de aniversário e Zoíudo

“Por favor, pede para papai noel um zoíudo para você. Você vai gostar muito. Arruma o cabelo dele, porque ele vai ficar bagunçado. Você é bonita e eu gosto muito de você. Eu te amo”.

 Em uma conversa, criamos um rito e um mito. Cuide bem de nossos tesouros, rena, nós amamos você.

   Escrito por: Júlia Gisler

Ficha técnica do livro
Nome: Contos de lugares distantes
Autor: Autor e ilustrador : Shaun Tan
Tradução: Érico Assis
Editora: Cosacnaify
Ano: 2013 

Quer conhecer mais sobre Shaun Tan? Confira nossas postagens no blog e dicas de mediação de seus livros em nossa revista eletrônica!


terça-feira, 24 de novembro de 2015

Sobre se sentir mais viva e no lugar certo

Quando é fim de semestre, estresse, nervosismo, muitas coisas pra fazer, em adição à sua vida fora do contexto universitário – obviamente cheia de situações que podem fazer você perder um pouco a cabeça –, o que possivelmente passa pela sua mente é: quero paz!

Mas daí chega o dia da sua contação. Você acha que não terá paciência o suficiente, nem sensibilidade para ouvir e entender as crianças que, somente naquele dia, têm sua intervenção literária. 

Porém, o que acontece é exatamente o contrário: você se sente mais viva e no lugar certo. Pode não ser bem a sua situação, mas foi a minha. Chegar à escola e observar todas aquelas carinhas prontas pra ouvir e discutir o assunto da contação do dia é extremamente reconfortante.



Deixá-las expressar tudo o que tiverem vontade, ouvir suas opiniões e histórias de vida, suas reclamações, seus prazeres, suas ligações entre a história contada e a vida real, são coisas que fazem com que, pelo menos naquela hora, haja um esquecimento das minhas próprias questões, dos meus próprios estresses e insatisfações. Faz  haver um mergulho no momento e a valorização de cada palavrinha dita, cada desejo de se comunicar e expressar tudo o que tiver vontade.

No final das contas, o mergulho no momento é tão importante quanto as intervenções literárias preparadas, o script imaginado, a "moral" da história. Deixar-se levar e criar um ambiente propício à troca de experiências fazem da contação algo significativo não só na vida das crianças,  mas na dos contadores também. 

Raylane


domingo, 15 de novembro de 2015

A Bolsa Amarela, de Lygia Bojunga.

Vencedora do Hans Christian Andersen em 1982 - um ano após o lançamento de Bolsa Amarela, sua Magnum Opus -, Lygia Bojunga Nunes ganhou o público infantil com suas histórias que respeitam a inteligência das crianças. Ao retratar a visão da infantil de forma não estereotipada, a autora me conquistou com este livro que comentaremos agora.



Narrada em primeira pessoa, a história é contada na a ótica de uma menina de sete a oito anos, a Raquel. Com uma linguagem que parece falar à alma, o texto nos reaproxima da infância e nos faz relembrar como, muitas vezes, os sonhos, anseios e  as opiniões das crianças são ridicularizados. Raquel é criativa, engraçada e cheia de idéias e histórias para contar.Ela pensa muito, mas muito mesmo, sobre a barreira entre adultos e crianças e nos leva questioná-la também, já que nos convence de que adultos e crianças são iguais. Só criança faz pirraça? Só adulto tem deveres e segue regras? Não? Então por que crianças são tratadas como se fossem menos inteligentes e adultos como seres superiores? Lendo o livro, a primeira revelação é ver a vida pelos olhos de uma criança. Infelizmente, em nossa cultura, tratamos crianças como seres com menos inteligência, como se elas não fossem capazes de refletir ou sequer notar o mundo a sua volta. 
Ainda tenho memórias frescas da infância, algumas inclusive em que agi de formas consideradas próprias de crianças "malcriadas",enfrentando adultos e consequentemente sendo chamada de  "menina atrevida", "petulante", "folgada",  "espertinha, dentre outros adjetivos usados por quem se acha superior em um diálogo. Mesmo assim, infelizmente, eu repito esse erro como se fosse natural. A questão faz recordar um viídeo "viral" da internet de uma menina que demonstra bem que crianças sabem sim o que acontece em sua volta, e que elas expressam isso à própria maneira, com muita perspicácia e sensibilidade.




Raquel, muito mais nova que os demais irmãos e sempre sendo silenciada por eles, sente-se só. Descobre então que, por meio da escrita, ela pode ser quem quer, fazer o que bem entender, ter quantos amigos puder, despejando no papel todas as suas vontades, a de ser "grande" , a de ser menino, a de ter amigos. Mas mesmo sua escrita desperta desconfiança nos irmãos mais velhos, cujo primeiro movimento é sempre o de duvidar da palavra da caçula. Assim, até para escrever cartas inventadas de amigos inventados para si mesma, Raquel é obrigada a elaborar intrincados planos para escapar do olhar sempre vigilante dos adultos. É a bolsa amarela, um objeto rejeitado pelos adultos de um pacote enviado por uma tia, que vai permitir que Raquel guarde e viva suas vontades, seus sonhos, suas histórias... 

Uma reflexão que Raquel se faz e que acabamos nos fazendo também ao viver suas aventuras é acerca da obsessão que nossa cultura possui por divisão de gênero. Oras, por que menina não pode soltar pipa, jogar bola, ralar os joelhos? Por que diabos usar rosa ou gostar de boneca é propriedade feminina? É só uma cor, um brinquedo, uma brincadeira. Embora a obra tenha sido escrita na década de 1970, tais questionamentos continuam, infelizmente, muito 
A obra nos mostra ser possível abordar quase qualquer questão com as crianças e nos lembra que fazíamos sim esses tipos de questionamentos, assim como nossos filhos também nos colocam tantas vezes contra a parede com perguntas que nem sempre sabemos como responder. 
Num trecho, Raquel se questiona sobre seu nascimento, que ela sabe, através das irmãs, não ter sido planejado. Isso a faz sentir-se, às vezes, como se estivesse "sobrando" na família. Questiona-se, consequentemente, sobre a escolha de ser mãe:
"Um dia perguntei para elas: Por que é que a mamãe não tinha mais condição de ter filhos? Elas falaram que a minha mãe trabalhava demais, já tava cansada e que também a gente não tinha dinheiro para educar direito três filhos, quanto mais quatro. Fiquei pensando: mas se ela não queria mais filhos porque é que eu nasci? Pensei nisso demais, sabe? E acabei achando que a gente só devia nascer quando a mãe da gente quer ver a gente nascendo."
Já no diálogo abaixo, Raquel questiona o conceito de "chefe da casa" :
"- Quem é que resolve as coisas? Quem é o chefe?
- Chefe?
- É, o chefe da casa. Quem é? Teu pai ou teu avô?
- Mas para que precisa de chefe?
-Para resolver os troços, ué; para resolver o que é que cada um vai estudar.
-Cada um estuda o que gosta mais. Tem livro aí, a gente escolhe o que quer.(...)
- Não tem sempre uma porção de coisas para resolver? Quem é que resolve?
- Nós quatro. (...)
- Mas pode?
- Por que é que não pode?"
Diversas outras reflexões na perspectiva de Raquel nos fazem pensar:  As opiniões dos pequenos precisam ser reprimidas, constantemente negadas ou moldadas? Tentar coagir ou censurá-las para que suas opiniões coincidam com as nossas funciona? Penso que tratar crianças como se elas não pensassem ou como se nós adultos fôssemos "a fonte de conhecimento" é apenas uma armadilha para nós mesmos.

Espero que tenham gostado da resenha. Se tiverem indicações de algum outro livro da autora de que tenham gostado ou de outras obras relacionadas, ou se já leram Bolsa Amarela e gostaram ou não, escrevam nos comentários! O feedback de vocês é muito importante para os resenhistas e mediadores do blog.


Autora: Amanda Barros

Considerações finais:
Agradeço ao blog Leitura no Varal  por  divulgar uma de nossas postagens. Continuem nos acompanhando e esperamos continuar agradando. A literatura infantil precisa de visibilidade.

Ficha Técnica:

Título: A Bolsa Amarela
Autora: Lygia Bojunga Nunes

Ilustradora: Marie Louise Nery

Edição: 35a (Primeira Edição em 1976).
Editora: Casa Lygia Bojunga (Rio de Janeiro).


Referências: 
WIKIPÉDIA BRASIL. Artigo Lygia Bojunga. <https://pt.wikipedia.org/wiki/Lygia_Bojunga> 31/10/2015; 11h18.(acesso)

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

4º edição da Oficina Conte Comigo do Livros Abertos: Aqui todos contam!



A 4º edição da Oficina Conte Comigo do "Livros Abertos: Aqui todos contam" fez parte da programação oferecida pela Semana Universitária 2015 da Universidade de Brasília (UnB), que ocorreu do dia 27 a 31 de outubro. Participaram da oficina estudantes da UnB e Educadores, que puderam conhecer a leitura dialógica e discutir diversas temáticas a partir das rodas de contação dialógicas desenvolvidas na oficina.

Aspectos essenciais da leitura dialógica foram comentados, tais como ler a história antes de contar às crianças, saber lidar com as perguntas, compreender se a criança está gostando e entendendo a história contada.
Houve também um embate entre a leitura dialógica e leitura convencional, em que se discutiu qual era mais cansativa ou em qual se gasta mais energia.
Segundo os participantes na leitura dialógica a criança gasta mais energia devido a proposta de participação do que na leitura convencional.


Uma participante comentou que “para a criança [a Leitura dialógica] é mais interessante, pois ela participa, ela tem espaço para falar, para se colocar e ser ouvida.

Assim, chegou-se a conclusão que na Leitura dialógica há mais liberdade para imaginar, refletir para além da história e relacioná-la com acontecimentos do dia-a-dia. O grupo salientou que para além da conclusão que a história do livro chegou, o grupo de crianças pode criar a sua própria conclusão como o mediador Manuel pontuou: “Quando a participação foge do livro, eu fecho o livro e nós criamos a nossa própria história".
Outro aspecto discutido foi “deixar ou não a criança ler a história no lugar do mediador?”. Segundo os participantes, por mais que o grupo disperse, para crianças que estão iniciando o processo de aprendizagem da leitura, esse incentivo é importante.  
Outro tema bastante comentado foi a relação entre leitor e livro. Destacaram que o livro é uma forma de se autoconhecer, de dar forças para vencer os medos e anseios. Os livros não geram só prazer, mas também inquietações. A criança em sua relação com o livro e a leitura dialógica faz com que ela expresse os acontecimentos que ela projeta no livro, seus sentimentos, entre outras coisas. A Leitura dialógica é um espaço das crianças e por isso a escuta atenciosa e respeitosa também se faz necessária.


Enfim, muitas coisas foram compartilhadas, tantas que esse texto poderia ser mais longo.




Assim para finalizar a dinâmica foi perguntado a cada um da roda “em uma palavra, o que é necessário para ser um bom mediador de leitura?”


"Ser criativa(o), leitor(a), engraçada(o)"                  "estar aberta(o), ser ouvinte, colhedor(a)
                                                                                      paciente, entender as crianças, ser 
"amiga(o), entrar no mundo da criança                       (e também mostrar o seu mundo a ela"
despertar, ser um captador de memórias, sensível,      
brincalhão (lhona), deixar de ser a sabichona(ão)",

                                                                      "ser observador, perseverante, alguém que faz a diferença pela relação da criança com a leitura, ser cativador e cativante, ser amoroso(a)".




Ao final foi possível que os participantes fizessem uma breve avaliação, contribuindo com sugestões para oficinas posteriores. Segue-se um exemplo de avaliação feito na oficina:


  • Que Bom: “Muito bom a parte do debate, pois você acaba aprendendo com as experiências de outras pessoas e também a parte da dinâmica de contar historias, pois tem uma vivência real de um mediador de leitura e a visão dos desafios que ele poderá enfrentar
  • Que pena: “Que pena! Poderia ter em mais escolas.”
  • Que tal: “Que tal a oficina ser dois dias? Em um dia seria passado a experiência do projeto. E no segundo dia teriam alunos para que pudéssemos contar historias”.

Agradecemos a todos que contribuíram com a avaliação e que participaram da 4º Edição da Oficina Conte Comigo!

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Lila e o Segredo da Chuva (Diário do Contador)

Quando me encontrei com esse livro, pensei que seria bem oportuno levá-lo para a mediação com as crianças, pois estávamos naquele período de altas temperaturas e baixa umidade em Brasília. 
Essa obra foi a responsável por eu conseguir cativar as crianças, digo isso porque as mediações anteriores foram bem desafiadoras, pra não dizer difíceis mesmo. Mas essa situação mudou e ficou esclarecida quando a professora contou que eles não tiveram mediadores desde o início do ano, e se levarmos em consideração que a maioria dessas crianças estão tendo contato com a escola e quiçá com a leitura, pela primeira vez. É uma turma de 1º ano (sete anos). 

http://www.editorabiruta.com.br/wp-content/uploads/2014/08/Lila-e-o-segredo-da-Chuva-OK.jpg















 
No dia, levei também um livrinho com o mapa mundi e iniciei o diálogo contando que essa garotinha morava no Quênia… Só aí já rendeu muita prosa, pois esse é também o nome da professora deles (Kenia). Lila é uma garotinha que, motivada pela insatisfação com a falta de água no vilarejo em que mora com a família, resolve (com um empurrãozinho do avó), buscar o segredo que faz chover. 

http://image.slidesharecdn.com/lilaeosegredodachuva-141129125256-conversion-gate02/95/lila-e-o-segredo-da-chuva-7-638.jpg?cb=1417265658


Conversamos sobre por que chove, como chove… Sobre isso, uma criança falou que era quando o “papai do céu” ficava triste… Na hora, outra criança interviu dizendo que não, na verdade isso acontece porque as nuvens ficam carregadas d´água.

Muita conversa, reflexão sobre as explicações dos fenômenos naturais e imaginação rolou! Fizemos até a dança da chuva (risos...). Sobre isso, uma menina comentou: 
- Tia, a gente leu a história da chuva e não é que choveu?

Foi uma experiência muito grata esse dia, por isso fiz questão de compartilhá-la com vocês.

Ficha técnica do livro 

Coleção:contos mundo afora 
Obra: Lila e o segredo da chuva 
Autor: David Conway 
Ilustração: Jude Daly
Editora: Biruta
Ano: 2010
Samara Alencar :)




terça-feira, 3 de novembro de 2015

A Grande Questão, de Wolf Erlbruch (Diário do Contador).

Semana passada tive a experiência de levar A grande questão de Wolf Erlbruch para a contação. O livro, trazido ao país pela editora Cosacnaify, proporciona uma reflexão sobre as grandes questões da vida.
Afinal, por que viemos ao mundo? Por que existimos?


Entre as pequenas, médias e grandes questões em nossa vida, ai está uma difícil de responder, não só pela complexidade do tema, mas porque uma resposta não parece o suficiente. Wolf brinca com essa ideia, com ele exploramos o mundo para conhecer o sentido da vida pelo olhar de diversos personagens. Encontramos a resposta dos familiares parentes do protagonista, dos animais domésticos... Ninguém quer perder a oportunidade de dar o seu porquê para o leitor curioso: o padeiro, a pedra, o número três... Até mesmo a morte vem fazer sua contribuição para a grande questão.
É instigante ver como, em ilustrações tão sintéticas, Wolf consegue trazer tantos elementos paraa reflexão. As crianças captaram mensagens sutis por entre as colagens e desenhos do autor. Em muitos momentos da contação, tive a impressão que elas conseguiam ler o código escrito, pois apenas com as imagens conseguiam captar o texto e a proposta do livro.
No início da contação, estávamos no pensamento concreto. De acordo com as crianças, estávamos onde estávamos para ouvir histórias, e existimos "porque sim", oras.
Mas, aos poucos, a cada página e conversa, as crianças construíam juntas outros porquês. Para elas há mais na vida do que ficar no mesmo lugar como uma pedra ou obedecer as regras como um robô.
Pobre do 3, que justifica nossa existência no mundo para que um dia aprendamos a contar até 3! Havia crianças que já sabiam contar até 40! Para além de novas explicações e de olhar o mundo e a vida sob diversas perspectivas, o livro nos convida a repensar:  O que fazer quando nossas ideias e nossos valores mudam ou quando atingimos nossas metas atuais?
Convido aos leitores a conhecerem este livro e a obra do autor, e quem sabe descobrir mais uma resposta para ...
http://ecx.images-amazon.com/images/I/41z99fmwwDL.jpg


Quer contar este livro de forma dialógica? Confira muitas dicas e sugestões para a mediação desta obra na Revista Livros Abertos!

Ficha técnica do livro
Nome: A Grande Questão
Autor: Autor e ilustrador : Wolf Erlbruch
Tradução: Roberta SaraivaSamuel Titan Jr.
Editora: Cosacnaify
Ano: 2012  
Confira o slideshow do livro disponibilizado pela editora no link a seguir: http://editora.cosacnaify.com.br/legacy/slideshow/show_questao.htm




quinta-feira, 29 de outubro de 2015

A raiva: como lidar com ela?.






A raiva: Uma emoção-tabu. Pouco ou nada aprendemos que nos ajude a entendê-la e a lidar com ela. Se você é criança e expressa raiva, está sendo mal-educado(a) e será silenciado(a)". Se é mulher, é "histérica" e deve também ficar calada. Se é homem, "não deve deixar barato" e é encorajado a partir para a agressividade.Como lidar com a raiva e ajudar a crianças a lidarem com ela?  Espera-se que elas se controlem, mas pouco se faz para ajudá-las a entender suas emoções mais coléricas e encontrarem recursos para lidar com elas. A mediação de leitura de "A Raiva", de Blandina Franco e José Carlos Lollo, tem rendido excelentes diálogos com crianças de várias idades no Projeto. Com base nessas experiências, a Revista Livros Abertos traz algumas sugestões para a leitura compartilhada da obra.

Veja nossas dicas para a mediação dialógica AQUI.

Esperamos que gostem! E lembrem-se, toda terça tem novidade em nossa revista eletrônica, especializada em dicas para a mediação de leitura e destinada a educadores, famliares, bibliotecários e outros mediadores de leitura.

Obra: A Raiva
Autores: Blandina Franco e José Carlos Lollo
Editora: Pequena Zahar

Porque mediar leitura é muito mais que "ler historinha"!






terça-feira, 20 de outubro de 2015

Oficina Conte Comigo 4ª edição - Evento gratuito! Vagas limitadas!

Os (as) extensionistas do Projeto Livros Abertos tem o prazer de convidar todos(as) os (as) interessados(as) para a 4ª edição da oficina "Conte Comigo". A atividade compõe a programação da Semana Universitária da Universidade de Brasília, que acontecerá do dia 27 a 31 de outubro de 2015.


A oficina contará com a seguinte programação:
  • Quebra-gelo
  • Apresentação do projeto Livros Abertos
  • Vivência prática de leitura dialógica
  • Coffee break
  • Debate
  • Exibição do vídeo institucional
  • Fechamento

                          Essas são algumas fotos da última edição da oficina (2014) :)



Passo a passo para se increver na oficina:

CLIQUE AQUI!

Feito isso, insira seus dados. Caso não possua um cadastro, crie um :)
Ao fazer login no sistema, clique na barra ao lado do perfil, depois em> inscrição >inscrever em eventos> em filtros inserir na área temática: cultura; modalidade: oficina; campus: campus universitário Darcy Ribeiro e finalmente escolher a oficina - 562 - oficina "conte comigo" Quarta Edição, clique no quadro verde da atividade e depois em realizar inscrição.

Prontinho! Sua inscrição foi efetivada!
Venham participar conosco! Leve seus amigos e lembre-os de se inscrever pelo portal da Semana Universitária.
Ahh! E divulguem a oficina! ;)

Serviço: GRATUITO! VAGAS LIMITADAS!
Oficina Conte Comigo

27 de Outubro de 08h às 12h
Local: UnB, Campus Darcy Ribeiro
Faculdade de Educação, FE 01 - Sala Papyrus.



Esperamos vocês \o/
Equipe Livros Abertos 

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Ler é também relacionar

Hoje, resolvi trazer citações, de maneira mais leve e descontraída, para que possamos pensar: O que tem incomum a leitura dialógica? 

Anda mamãe muito iludida, pensando que aprendo muita coisa na escola. Puro engano. Tudo quanto sei me foi ensinado por vovó, durante as férias que passo aqui. Só vovó sabe ensinar. Não caceteia, não diz coisas que não entendo. Apesar disso, tenho cada ano, de passar oito meses na escola. Aqui só passo quatro... (Monteiro Lobato).


“Como é gostoso e importante para a formação da criança ouvir histórias. Ao contá-las instigamos a curiosidade e o desejo de "quero mais”, expresso pelas crianças no “conta outra vez”. São esses sentimentos que nos movem para conhecer e aprender as coisas que estão no mundo, e, sabendo as registradas em livros, certamente iremos recorrer a eles, nos tornando, assim, leitores por desejo e motivação. (Perrone e Lara, 2002, p. 123).




”Boa leitura é aquela que leia o que não há entre página e página da mesma folha”
(Agostinho da Silva)


“A leitura do mundo precede a leitura da palavra”
(Paulo Freire)


Foto: Getty imagens


"Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta."
(Mário Quintana, com adaptações). 


Referências: PAÇO, Glaucia Machado de Aguiar. O Encanto da literatura infantil no CEMEI Carmem Montes Paixão. Disponível em:<http://www.ufrrj.br/graduacao/prodocencia/publicacoes/desafios-cotidianos/arquivos/integra/integra_PACO.pdf>. Acesso: 11, out. 2015, 22:15:30


Rosileide Silva Santos

sábado, 10 de outubro de 2015

Livros infantis e empoderamento: reflexões sobre a escolha das obras.

Com a diversidade como pauta de discussões em escolas, é natural que professores recorram à literatura infantil para iniciar ou complementar debates acerca do assunto. Todavia, selecionar a obra e analisá-la antes da leitura compartilhada é muito importante. Não digo que crianças necessitam de um mediador para ditar o que ela deve ler ou não, mas, para o mediador que vai compartilhar uma obra com as crianças, é fundamental ler o livro antes e pensar sobre ele, seja individualmente, seja em rodas de discussões.
Existem livros infantis que são usados por adultos para tentar passar uma mensagem  e acabam passando outras, que até contradizem a suposta "quebra de paradigmas" que o adulto quer discutir com as crianças. Quantos mediadores já não procuraram obras partindo de temas específicos que queriam trabalhar, viram que eram acessíveis, mas, ao ler a obra, que decepção... Que atire a primeira pedra quem nunca fez isso...Claro que a própria instrumentalização da obra infantil e sua escolha pelo "tema"  é bastante questionável, mas isso fica para uma próxima postagem.Por enquanto, quero discutir o que já acontece: certas obras são recomendadas como instrumentos para quebrar preconceitos e dar voz a grupos discriminados, mas a escolha nem sempre é criteriosa.
Minha intenção nessa resenha é apenas dar a minha opinião sobre duas obras famosas sempre citadas para abordar a diversidade, mas de que eu não gosto tanto, porque acho que têm muitas falhas para cumprir esse objetivo. Para quem utiliza os livros em parte com esse tipo se propósito, é importante que possa questionar se a obra é a melhor escolha e se ela ajuda de fato a flexibilizar os pontos de vista das crianças e a quebrar preconceitos.

Menina bonita do laço de fita

Um clássico de Ana Maria Machado. Quase sempre que procuro livros sobre etnia, essa obra está na lista. 


Resumindo o livro: O protagonista é um coelho branco que observa uma menina negra e passa o livro inteiro perguntando pra ela como ela faz pra ser preta, ovacionando o quanto ela é bonita por este fato.

Se vamos debater sobre protagonismo e usar este livro específico para criar empoderamento, para mim, o negro vir em segundo plano já é um problema. O protagonista não é a menina, que aliás, nem tem nome. Ela, na história, é a menina de pele escura, não tem voz, ela só fala quando o coelho branco "dá permissão" por meio de suas perguntas.

O papel da menina negra é apenas ser o objeto de admiração do coelho, sendo até sensualizada em uma imagem:



Na história não acontece nada, é apenas diálogo pronto de "menina, o que faz pra ser pretinha?" e a menina fala qualquer coisa ligada à cor preta. Aliás, vale um "close" no ""blackface" do coelho...



Quando a menina diz que talvez sua pele seja preta porque comia muita jabuticaba, o narrador conta que o coelho não ficou preto, mas o seu cocô, sim. Uma conexão totalmente desnecessária e que obviamente não faz nada para recomendar o livro em termos de empoderamento e autoestima...




A obra reproduz uma abordagem forçada e preconceituosa de etnia,  insinuando que ser negro é ser exótico e, para ser legal, tem que ter um branco afirmando que é (me poupem de dizer que, por ser um coelho, está tudo ok). Esse aspecto se concretiza com o uso do termo "mulata" para designar a mãe da menina pretinha (se isso não era considerado inadequadonos anos 70, quando o livro foi escrito, isso justifica usá-lo hoje como escolha para empoderar crianças negras?) Aliás, a mãe não fala em primeira pessoa, mas é narrada: para ser preto tem que ter preto na família. O coelho então casa com uma coelha preta pra ter filhos de "todas as cores". Conclusão: ser negro é algo exótico, o papel da negra é ser objeto de sensualidade e uma incubadora. A hiper-sexualização da mulher negra e a exotização do negro para torna-lo "positivo" são problemas que o movimento afro tenta combater. Como uma obra que naturaliza esses preconceitos pode ser usada para debater o racismo? Eu, particularmente, por todas essas razões e outras mais, detesto esse livro. Não sei se as pessoas que o indicam em blogs afros já o leram, sinceramente.

Lado bom: é um dos pouquíssimos livros, na época em que foi publicado e, infelizmente, até hoje,  em que uma das personagens principais é uma menina negra, e apesar de exaltar a sua beleza através da voz de um (coelho) branco, sua beleza é o destaque. Já que representatividade é fundamental, e ela se encontra bastante escassa nesse contexto, a obra tem sua importância, sobretudo uma importância histórica. Precisamos pensar em opções contemporâneas mais afinadas com um compromisso com a representatividade genuína das crianças negras na literatura.


Até as princesas soltam pum

Ao contrário do livro acima, esta obra,de Ilan Brenman, eu não detesto, mas também acho que aqueles que recomendam a obra para empoderar meninas deram, no mínimo, pouca atenção ao conteúdo do livro, pois a história acaba reforçando estereótipos, embora pareça inicialmente subvertê-los. Conhecendo um pouco sobre o autor e sua visão de literatura infantil, suponho que, talvez, ele não se identifique com compromisso algum de empoderar meninas nem de levar a uma reflexão feminista, mas apenas de entreter, brincar e fazer rir, sem pretensão de crítica a valores vigentes. No entanto, o fato de o autor não concordar que a literatura infantil deva servir a propósitos externos nem ser julgada por critérios como esses não impede que o livro seja amplamente vendido como interessante para quebrar paradigmas. Prova disso é a recomendação da obra em listas do tipo "livros que toda menina deve ler". O livro constuma ser citado como especialmente bom para quebrar idéias fixas sobre como meninas devem se comportar... (nesse caso,aliás, me pergunto por que essas listas não recomendam presentear o livro a meninos também!!). Considerando tudo isso, farei minhas considerações acerca do potencial desta obra para realmente ajudar a quebrar paradigmas. 

Resumo: uma menina chega em casa aflita perguntando ao pai se era possível uma princesa soltar pum. E ele, em sua sabedoria, mostra a ela um livro secreto das princesas que ele guardava mostrando que sim, mas tudo com extrema cautela.

O problema que o livro aborda, com muito humor mas pouca subversão, é o lugar da escatologia no "universo feminino". Desde crianças, meninas são ensinadas que verdadeiras damas precisam esconder ao máximo o fato de terem necessidades fisiológicas, e, quanto mais livres disso, mais perfeitas. A princesa é o símbolo de perfeição, logo, como ela iria soltar pum? Por meio do humor, essa questão é discutida a partir de diversos ângulos. No entanto, eu esperava que, de forma leve, o livro contribuísse para dar um basta nessa ideia de que ladies não fazem cocô e devem ter vergonha disso e guardar segredo. Mas não. Quando chegamos ao "livro secreto das princesas" vemos que elas soltavam pum sim, mas eram tão "sortudas" que os momentos em que cometeram esse pecado não foram registrados ou descobertos por seus príncipes, com entusiasmos da menina protagonista de "essa foi por pouco!!!" ao ouvir seu sábio pai confessando as heresias das ladies impostoras. E no fim, ainda reforçam com "Princesas soltam pum, sim, mas mantenham o segredo".

Nem precisaria citar que o fato de ser um homem a guiar o conhecimento da menina acerca do "universo feminino" me irritou. Mas o que mais me irritou, na verdade, foi a decepção. Me animei, por ser comédia, mas chorei, por ver que a história reforça novamente que a mulher, sempre muito mais que o homem, precisa se envergonhar de suas funções corporais. Todas as princesas soltam pum, mas ó: segredo!


Autoria: Amanda Barros


BRENMAN, ILAN. Até as princesas soltam pum. Editora Brinque Book, 2008.

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

O incrível mundo da leitura

Olá pra você que acredita que, com um livro, podemos sonhar alto, ir para um mundo incrível onde monstros existem, animais falam, e coisas imaginárias se tornam reais. Que sabe da importância da leitura e dos diversos benefícios que ela traz, não só pra vida acadêmica, mas pra vida, principalmente de uma criança.
Bom.. vou falar um pouquinho da experiência que tive com essa nova família que me acolheu, o "Livros Abertos: Aqui Todos Contam!". Pra começar, nas minhas primeiras contações eu fiquei bem receosa em relação aos pequenos, não sabia se iriam me receber bem ou se iriam gostar das minhas histórias. Mas não custava nada tentar, né? Além do mais, crianças são crianças, pequenos seres iluminados curiosos para descobrir o mundo. Besteira da minha parte pensar que não iria dar certo, fui calorosamente acolhida e sempre sou recebida por muitos beijos e abraços deliciosos!! Quanto amor.. fico até boba.
Ah!! Esqueci de contar que, coincidentemente, eu arranjei um emprego de monitora em um cursinho no mesmo período, no qual eu também faço mediações dialógicas. E o mais incrível é que todos ficam super empolgados e até incentivados, com sede de mais e mais histórias, não só onde eu trabalho mas na escola onde eu faço a contação também. Eu fico encantada de como realmente um bom livro, com uma intervenção saudável, consegue captar a atenção de uma criança. Elas ficam imergidas em uma outra dimensão e acabam te intrigando com a espontaneidade delas. É  uma atividade lúdica, que consiste em ações vividas e sentidas, não definíveis por palavras, mas compreendidas pela fruição, pela fantasia, pela imaginação e pelos sonhos que se articulam como teias tecidas com materiais simbólicos. São vivencias que se distinguem dos prazeres estereotipados, das ações dadas ou prontas, tendo em vista que expressam a singularidade dos indivíduos que as experimentam.
O mais legal é que, com as histórias que vou contando, as crianças vão me relatando alguns acontecimentos da vida delas, comparando com os personagens principais dos livros ou  compartilhando sentimentos que elas tiveram com a narrativa. E esses são alguns dos motivos que me incentivam a querer fazer parte, cada vez mais, dessa família.
Finalizo então contando um pouco da minha experiência e dos frutos que uma simples contação de histórias pode gerar. Espero que tenham gostado e até a próxima aventura!


Com carinho, Jessica Tsai