domingo, 6 de janeiro de 2013

Leituras dos mediadores...

BOJUNGA, L. Aula de inglês. Rio de Janeiro: Casa Lygia Bojunga, 2006. 


Hoje começamos uma nova seção neste blog, por enquanto com título provisório. Tenho certeza que os mediadores saberão encontrar um nome mais bonito. A ideia é registrar algo que já estamos fazendo há mais de um ano em nossos encontros semanais, ou seja, compartilhar nossas leituras.  Como compartilhar algo que não possuímos? Se muitos começam a fazer mediação de leitura ainda com dúvidas sobre sua relação com a literatura, e se amar é dar o que não se tem, também é verdade que, no processo, descobre-se possuir muita coisa que se achava perdida ou desconhecida. Muitos dentre nós inventamos ou  reinventamos o prazer de ler no processo de mediação, e as trocas e discussões sobre as nossas próprias aventuras literárias têm sido tão importantes e frequentes em nossos encontros, quanto os debates sobre a mediação em si. 


Inauguro, então, esta seção, com minhas impressões acerca de uma leitura recente: Aula de Inglês de Lygia Bojunga, publicado pela Editora Casa Lygia Bojunga.


Lygia Bojunga 

Como vocês sabem, Lygia Bojunga é uma renomada autora de obras infantis e infanto-juvenis e já ganhou vários prêmios internacionais importantíssimos, dentre eles o Astrid Lindgren Memorial Award, considerado um dos mais importantes, se não o mais importante e honroso do mundo, nesse campo. Neste blog, já tivemos uma belíssima resenha de sua obra Corda Bamba, feita por Katsumi, uma das primeiras mediadoras do Projeto. O que eu mais gostei naquela resenha foi que partiu de uma redescoberta do livro por parte de Katsumi - ela, que havia "odiado" o livro, segundo suas próprias palavras, ao ter que lê-lo obrigatoriamente para a escola (cada vez mais me convenço de que esse modo de "incentivar" a leitura é bastante contraproducente).  Katsumi, então, resgatou a obra, já adulta, e teve uma experiência completamente diferente, conforme vocês mesmos poderão constatar acessando o post, neste blog.

Aula de Inglês não é propriamente para crianças, eu a situaria mais na categoria de "literatura para jovens e adultos", embora saibamos serem tais categorias algo arbitrárias. O que é bonito, ao meu ver, é que, embora envolva as dificuldades, alegrias e inquietações de uma moça de dezenove anos, a história não é "egocêntrica", no sentido de ser centrada no ponto de vista de uma moça dessa idade, com narrativa alheia às outras perspectivas possíveis (como tantas obras em voga nas estantes das livrarias...). Pelo contrário: ficamos sabendo das angústias da jovem Teresa Cristina indiretamente, por meio das percepções e do fluxo de consciência de seu professor de inglês, que já tem mais de sessenta anos  (ele não tem nome, talvez para enfatizar como é visto pela jovem: como um ótimo professor de inglês e um velho amável e gentil, mas não como uma pessoa, tão cheia de contradições e paixões quanto ela - quantas vezes os jovens são assim, cegos para os adultos, vendo-os apenas em seus papéis de pais, professores, etc.!  - lembrei-me da letra do Legião Urbana: "são crianças como você...") . Através dos olhos deste Professor de Inglês, amante da fotografia e perdida-secretamente apaixonado por Teresa Cristina desde o primeiro encontro, vemos os "instantâneos" das expressões sempre-cambiantes da moça e de sua intensidade no viver. O professor é transportado, ele também, às lembranças de sua juventude e de seu primeiro amor. Sem as condescendências nem a superficialidade dos personagens de muitas obras "destinadas" aos jovens, a obra nos leva a questionar vários aspectos pouco questionados entre os jovens, tais como a visão do mais velho com alguém assexuado e a ideia de que pessoas que moram a sós sofrem necessariamente de solidão e são infelizes. 

Gostei muito também do uso de recursos gráficos usados pela autora para transmitir algumas emoções. Por exemplo, uma conversa telefônica triste com a Teresa Cristina, extremamente decepcionante para o Professor, de despedida, está escrita assim:

- Mas estou em São Paulo: vou pegar o vôo
daqui mesmo. Eu vim ontem com o Octavio
Ignacio pra gente ainda encontrar o pessoal
da ONG. To aqui com eles todos. Mas
não tem pressa, professor, quando
eu voltar o senhor me dá o livro.
Muito obrigada, viu. Olha,
eles estão me chamando.
Um abraço, professor.
Ligeira pausa.
- Boa viagem, Teresa
Cristina.

Quando li isso, senti, quase fisicamente, a esperança do professor de rever Teresa ir sumindo, sumindo, até sobrar só a tristeza da partida.




Enfim, um livro, em todos os sentidos, sobre a aprendizagem de "novos idiomas" que acontece em nossas vidas: crescer, mudar, envelhecer, apaixonar-se, casar e descasar, achar novos lugares... gostei muito e recomendo!


Abraços e um Feliz 2013 a todos!

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei o blog! Já estou divulgando! Bjs!!