Quando iniciei a minha jornada no fantástico universo da leitura, eu tinha pouco mais de cinco anos de idade; e nesse caminho aconteceram algumas histórias curiosas que eu gostaria de compartilhar com vocês leitores/as.
Houve
uma época que quase todo final de semana eu passava na casa de meu
tio-avô Raimundo. Na casa dele, bem lá nos fundos, havia um depósito
com um monte de coisas
esquecidas: bolas,
bonecas, bolsas, panelas
e livros! Muitos livros! Fiquei encantada com três deles, dos quais
infelizmente não consigo recordar os nomes, mas eles foram bem
especiais para mim. Meu tio avô permitiu que eu ficasse com eles,
tamanha deveria ser a minha empolgação. Nesse período, eu ainda
estava aprendendo a ler,
então
eu ficava
inventando histórias
para aqueles personagens, dando nomes a eles e interpretando as
imagens.
Ainda
naquele ano, viajei de barco para a ilha de Marajó, passar as férias com
a família. Como a viagem é longa, tratei de colocar os meus
livrinhos na mala para passar o tempo. Durante o trajeto, ao lado da
minha rede, havia uma mulher com um sorriso muito bonito, ela
era branquinha, branquinha e suas bochechas eram bem rosadas. Ela
percebeu que eu não largava os livros, e para interagir comigo,
fazia perguntas sobre a história que eu estava lendo. A mulher das bochechas rosadas folheava
os livros
e inventava
histórias a partir das ilustrações, assim como eu. Umas das coisas
que me cativou nela, foi que ela prestava atenção em mim, e dava
importância para o que eu pensava. O nome dessa pessoa mágica era
Genilsa. Era apenas o início de uma grande amizade. Definitivamente
essa viagem ficou marcada pra sempre na minha história.
Não
me recordo muito do mês que passei na ilha, mas lembro que depois das férias
acabarem, tudo voltou ao normal. Mas nem tanto, afinal tínhamos uma
nova integrante na família!
E que ainda por cima
morava bem próximo de casa.
Minha mãe e eu fazíamos muitas
visitas, e na primeira
vez que fomos na casa da Genilsa, ela
me levou
até a estante da sala,
que era cheia, eu disse cheia de
gibis da turma da Mônica. Parecia
um sonho! Ela colecionava revistinhas da Mônica!
Ficamos o final de semana todo na casa dela. E foi lá, entre os gibis,
que "de uma hora pra outra"
eu me percebi que
lendo as histórias em quadrinhos. Eu não mais inventava, agora já conseguia desvendar os mistérios que haviam por trás daquelas
letras como num passe de mágica.
No
mês de outubro, que
é o mês do círio de
Nossa Senhora de Nazaré
em Belém,
uma festa tradicional para os católicos da cidade e do Estado, um
amigo da família que eu considerava como se fosse meu tio fora
passar a festividade na cidade. Lá estava eu, super empolgada com a
estadia do tio Piska em casa, mas esse acontecimento não me impediu de ir para aula normalmente :(
Na
escola, estando prestes a bater o sinal do recreio, a professora me
chamou para me entregar o texto que eu tinha escrito há
alguns dias. Ela ficou bem feliz com o que eu escrevera e não poupou nos
elogios. Eu, claro, fiquei muito contente com o resultado do meu
trabalho. Mas nem todos ficaram...
Quando
o sinal do recreio tocou, guardei o papel que continha o texto
na mochila e sai para
lanchar, nesse dia o
lanche era mingau de aveia.
Após eu repetir uma, duas, algumas vezes o lanche, comprei uns pirulitos e
voltei pra minha sala.
Quando
eu abri minha mochila, para minha surpresa,
lá estava a carta toda
molhada de mingau. Fiquei por uns segundos sem entender o que havia
acontecido, mas não demorou muito pra eu perceber quem tinha feito,
pois a responsável não parava de me olhar. Era a Safira, uma
garotinha que não ia lá muito com a minha cara, mas que de vez em
quando fingia ser minha amiga. Não lembro o que aconteceu na escola,
se eu contei pra professora...
Mas
ao chegar em casa, contei aos prantos pra minha mãe
o que tinha ocorrido.
Meu tio Piska escutou
e veio falar comigo,
na conversa ele me disse que tão logo chegasse em casa, ele
providenciaria alguns livros para mim.
Passado
algumas semanas eu acabei esquecendo o que ocorrera com a carta e da
promessa dos livros que meu tio fez. Nesse meio tempo
começaram
a surgir livros misteriosamente em casa, ninguém sabia me dizer de
onde vinham. Só que eu não parava de pensar de onde eles estavam
surgindo. Até que
um dia catando um giz de cera debaixo da cama, encontrei uma caixa de
papelão cheia de livros infantis, pra todos os gostos, dos mais
diversos. Livros com dobraduras, livros de ciranda, contos, poesia.
É, realmente meu tio Piska havia cumprido o que prometera.
Minha
tia contou que ela
queria que eu
fosse descobrindo os livros um por um, e dessa forma eu iria
valorizá-los mais e assim também eles não se
perderiam nas minhas
brincadeiras. Ela queria ter certeza que eu cuidaria de todos com o
cuidado que eu tive com aquele único texto ensopado de mingau, e que
mesmo sendo apenas um papel, eu cuidava como muito zelo.
Esse
foi apenas um episódio da minha infância, uma parte que tenho
guardado no fundo do coração. Ao refletir sobre o quanto que a
leitura ocupa um lugar especial na minha vida, percebo claramente que
a forma como essas pessoas que citei mediaram essa experiência
foi fundamental para eu desenvolver essa relação prazerosa com
os livros ainda hoje.
E é
por acreditar e apostar nessa mediação dialógica que nesse semestre
escolhi participar de um projeto como o "Livros Abertos".
Com
carinho, livros e braços abertos,
Samara
Alencar.
2 comentários:
Que história mais linda! O que Maia me tocou foi como suas experiências de leitura se entrelaçam com amizades. Os livros e as leituras de nossa vida são também os laços que criamos com os outros.
Que história mais linda! O que Maia me tocou foi como suas experiências de leitura se entrelaçam com amizades. Os livros e as leituras de nossa vida são também os laços que criamos com os outros.
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