Em uma das minhas mediações com crianças do 5º ano
do Ensino Fundamental - 10 e 11 anos - utilizei o romance infanto-juvenil Trash, escrito por Andy Mulligan,
indicado em uma das reuniões do Projeto Livros Abertos.
Quando
apresentei o livro para as crianças, elas não gostaram, pois, segundo elas, “o
bom mesmo é história de terror”. Contei o primeiro capítulo, mas as crianças se mostraram
apáticas frente à narrativa. Fui pra casa chateada, pois o livro era fantástico. Comecei então a pensar que o problema era eu, talvez não estivesse sabendo conduzir a narrativa. Em meio a esse conflito, decidi que leria
novamente o livro, e que desta vez, eles iriam adorar a história.
Traçada a meta, fui atrás de mais informações sobre
o livro, e acabei encontrando o filme baseado no livro: Trash: A Esperança vem do Lixo. Ao ler o livro e assistir o filme,
tive a plena convicção que as crianças iriam adorar a história. Então, defini
que não leria o livro impresso na mediação, mas escutaríamos o áudio da
história, narrado e gravado por mim.
Na contação seguinte, levei o trailer do filme e o
áudio do prmeiro capítulo lido com minha voz. As crianças logo se assustaram:
- Cadê o livro, tia?
Expliquei que a contação seria um pouco diferente,
escutaríamos o áudio da história, e após cada capítulo conversaríamos. Antes de
iniciar a mediação, fiz a maior propaganda da obra e mostrei o trailer do
filme. Ficaram maravilhados e animados para ouvir a história. Sentamos em
círculo bem próximos uns dos outros, e escutamos o áudio. Para a minha
surpresa, ficaram todos bem atentos ao desenrolar da história e, ao final de
cada capítulo, a participação foi geral.
Por mais estranho que possa parecer, o áudio
funcionou esplendorosamente. Eles sabiam que era eu que estava contando, mas
num suporte diferente, no caso especifico, o celular. A cada capítulo, se mostravam mais animados e
curiosos. Conhecemos uma realidade cruel, mas também a esperança de dias
melhores. Infelizmente, não foi possível contar todo o livro, por causa das férias,
mas em nosso último encontro de julho, com o consentimento da professora, levei
o filme. E posso afirmar que a meta estipulada foi alcançada com êxito: as
crianças adoraram.
O livro Trash
despertou o pensamento crítico sobre os governantes corruptos, as diferenças
sociais, o abuso de poder etc. As discussões oriundas do livro foram todas bem
pertinentes, críticas e emancipadoras.
Crianças que antes apenas manifestavam seu nojo perante quem é obrigado
a morar no lixão, que tinham preconceito com os catadores, começaram a perceber
a indiferença de grande parte da sociedade mais afluente em relação a pessoas
em situação de pobreza e miséria e a compreender questões sociais de forma
crítica.
Sobretudo, o que eu senti ao
terminar de contar Trash para
as crianças foi um sentimento de esperança. Esperança naquelas
crianças, que através do livro conheceram e se sensibilizaram perante uma
realidade muitas vezes mascarada, ignorada, invisibilizada. Eles se deram conta
que essa realidade existe e pode ser mudada por eles. Nessa perspectiva, acredito
que esse livro foi uma sementinha na formação de bons cidadãos.
“Eu
me pergunto: o que foi que aprendi? O que foi que aprendi no lixão de Behala, e
com isso me transformou? Aprendi mais do que seria possível aprender em
qualquer faculdade. Aprendi que o mundo gira em torno do dinheiro" . Mulligan (2013, p.
137)
Livro TRASH
Autor: Andy Mulligan
Tradução: Antônio Xerxenesky
Idioma: Português
Editora:
Cosac Naify
Ano
de edição: 2013
Taíres Sena
Nenhum comentário:
Postar um comentário