domingo, 13 de setembro de 2015

"Trash", de Andy Mulligan: uma experiência de mediação inesquecível


 Em uma das minhas mediações com crianças do 5º ano do Ensino Fundamental - 10 e 11 anos - utilizei o romance infanto-juvenil Trash, escrito por Andy Mulligan, indicado em uma das reuniões do Projeto Livros Abertos.
 Quando apresentei o livro para as crianças, elas não gostaram, pois, segundo elas, “o bom mesmo é história de terror”. Contei o primeiro capítulo, mas as crianças se mostraram apáticas frente à narrativa. Fui pra casa chateada, pois o livro era fantástico. Comecei então a pensar que o problema era eu, talvez não estivesse sabendo conduzir a narrativa. Em meio a esse conflito, decidi que leria novamente o livro, e que desta vez, eles iriam adorar a história.
Traçada a meta, fui atrás de mais informações sobre o livro, e acabei encontrando o filme baseado no livro: Trash: A Esperança vem do Lixo. Ao ler o livro e assistir o filme, tive a plena convicção que as crianças iriam adorar a história. Então, defini que não leria o livro impresso na mediação, mas escutaríamos o áudio da história, narrado e gravado por mim.
Na contação seguinte, levei o trailer do filme e o áudio do prmeiro capítulo lido com minha voz. As crianças logo se assustaram:
- Cadê o livro, tia?
Expliquei que a contação seria um pouco diferente, escutaríamos o áudio da história, e após cada capítulo conversaríamos. Antes de iniciar a mediação, fiz a maior propaganda da obra e mostrei o trailer do filme. Ficaram maravilhados e animados para ouvir a história. Sentamos em círculo bem próximos uns dos outros, e escutamos o áudio. Para a minha surpresa, ficaram todos bem atentos ao desenrolar da história e, ao final de cada capítulo, a participação foi geral.
Por mais estranho que possa parecer, o áudio funcionou esplendorosamente. Eles sabiam que era eu que estava contando, mas num suporte diferente, no caso especifico, o celular.  A cada capítulo, se mostravam mais animados e curiosos. Conhecemos uma realidade cruel, mas também a esperança de dias melhores. Infelizmente, não foi possível contar todo o livro, por causa das férias, mas em nosso último encontro de julho, com o consentimento da professora, levei o filme. E posso afirmar que a meta estipulada foi alcançada com êxito: as crianças adoraram.
O livro Trash despertou o pensamento crítico sobre os governantes corruptos, as diferenças sociais, o abuso de poder etc. As discussões oriundas do livro foram todas bem pertinentes, críticas e emancipadoras.  Crianças que antes apenas manifestavam seu nojo perante quem é obrigado a morar no lixão, que tinham preconceito com os catadores, começaram a perceber a indiferença de grande parte da sociedade mais afluente em relação a pessoas em situação de pobreza e miséria e a compreender questões sociais de forma crítica.
Sobretudo, o que eu senti ao terminar de contar Trash para as crianças foi um sentimento de esperança. Esperança naquelas crianças, que através do livro conheceram e se sensibilizaram perante uma realidade muitas vezes mascarada, ignorada, invisibilizada. Eles se deram conta que essa realidade existe e pode ser mudada por eles. Nessa perspectiva, acredito que esse livro foi uma sementinha na formação de bons cidadãos.

“Eu me pergunto: o que foi que aprendi? O que foi que aprendi no lixão de Behala, e com isso me transformou? Aprendi mais do que seria possível aprender em qualquer faculdade. Aprendi que o mundo gira em torno do dinheiro" . Mulligan (2013, p. 137)




Livro TRASH
Autor: Andy Mulligan
Tradução: Antônio Xerxenesky
Idioma: Português
Editora: Cosac Naify

Ano de edição: 2013

Taíres Sena

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