Contação de histórias com crianças pode se tornar uma atividade lúdica que transmite aprendizado ao mediador. Isto porque, quem pensa que o público infantil não é exigente, se engana! As crianças esperam do mediador uma surpresa a cada encontro. Esperam que o livro seguinte seja tão bom ou superior aos lidos. Elas se agradam quando o mediador traz novidades, quando têm a oportunidade de descobrir, sentir e refletir.
Após dois semestres sem realizar contações, resolvi retornar ao Projeto Livros Abertos. E, claro, estava enferrujada. A turma na qual faço mediações é do primeiro período. Eu e minhas duas colegas fizemos a visita à escola para conhecer as crianças, fazer um quebra-gelo, conhecer a professora e verificar a idade e quantidade de alunos. Combinamos de dividir em grupos pequenos de quatro crianças para que pudéssemos dar atenção a elas. Assim, em cada encontro, cada mediadora ficava com oito crianças e sorteavamos, para termos a chance de contar a todas as crianças, ter contato com todas.
Como a faixa etária predominante era de cinco anos, procurei no acervo do projeto um livro que fizesse jus à idade e principalmente, para introduzir o universo da leitura dialógica na vida delas, já que não haviam tido contato algum na escola, até então.
Agora não me recordo do título do livro, mas planejei as intervenções e testei com meus primos da mesma idade. Meus primos adoraram, porém na escola foi um fiasco. As crianças não se interessaram, imagino que não tenha sido tão atrativo o livro, tampouco a contação. O local que escolhi também não foi uma boa opção para tal momento: o pátio da escola. É um bom local sim, mas não quando se quer introduzir uma coisa nova na vida das crianças. E eu tive que competir com um jogo que faz sucesso entre elas, o totó. Adivinhem o que elas preferiram? Elas brincavam, gritavam, rolavam pelo chão... E eu ali, totalmente perdida sem saber como reagir. Simplesmente sentei no chão e comecei a leitura sozinha, em voz alta, até que vez ou outra, por pura curiosidade, se aproximavam para ouvir e participar.
Não há como descrever minha frustração ao terminar a mediação. Achava que havia perdido o jeito para aquilo, e me senti desafiada a trabalhar duro para encanta-las com a leitura compartilhada. Exigiu autoavaliações e preparo.
Em nossa reunião semanal com os mediadores e a coordenadora, relatei o ocorrido. Alguns me deram dicas que ajudaram bastante, como em cada vez pegar apenas três crianças (diminuir a quantidade), procurar um livro com mais imagens (confesso ter dificuldade e estou trabalhando nisso, depois relato outra experiência), e tentar inovar.
Então vi o livro "Quando isto vira aquilo" no Acervo e peguei. Basicamente, o livro é só de imagens, muito bem coloridas e chamativas. Em cada folha há um animal, e parte do animal se transforma noutro animal na página seguinte. Ao todo, são uns vinte animais. E o melhor de tudo é que esses animais são bastante conhecidos pelas crianças. Baixei o áudio referente a cada bicho no celular. Levei as crianças ao pátio de entrada e comecei o livro.
Minha abordagem já foi diferente. Comecei me apresentando a elas, transmitindo intimidade e conhecendo-as mais profundamente. Fiz um mistério sobre o livro e comecei a contação. A cada animal as crianças queriam falar o que sabiam sobre aquilo, algumas manifestavam medo, outras diziam que adoravam, e nisso, contavam suas experiências particulares ou até mesmo inventavam algo só para ter o prazer de participar da conversa que estava tão agradável. Eu pedia que imitassem o som do animal e depois elas ouviam o som verdadeiro que encontrei no YouTube.
Foi fantástico! Nesse dia havia muitos pais na escola sentados próximo à coordenação. Eles ficavam atônitos prestando atenção e riam, achando maravilhosa a forma como as crianças interagiam.
Ao fim da contação queriam folhear o livro e decidir qual animal haviam gostado mais. Pedi que em grupo (para trabalhar a união, avaliação diferenciada, e harmonizar individualidade, criatividade, autonomia e relações em grupo) fizessem um desenho sintetizando o que mais gostaram. Então cada grupo desenhou animais, onde pegavam uma parte de cada animal e juntavam. Acho que se ativeram ao livro que transformava um animal no outro. Por isso digo que não devemos menosprezar a capacidade delas. Alunos de primeiro período pensaram desta forma!
Nesse dia a contação durou bastante tempo porque elas definitivamente não queriam retornar à sala. Crianças de outras turmas passavam e viam, queriam participar também.
Nesse dia a contação durou bastante tempo porque elas definitivamente não queriam retornar à sala. Crianças de outras turmas passavam e viam, queriam participar também.
Eu me senti tão feliz e especial que fiquei contagiada durante vários dias. E foi pelo ótimo resultado que refleti o quanto vale à pena se desafiar e propor inovações. O quanto é importante que o mediador/ professor tenha em mente reinventar seus métodos e adequá-los à necessidade dos alunos. Acredito que todos saímos satisfeitos!
Escrito por: Monique Evelyn Pimentel Zanela
Ficha técnica
Título: Quanto isto vira aquilo
Autor: Gustavo Lins
Editora: Rocco
Ano de edição: 2008
Um comentário:
Gostei demais do seu relato, Monique! Parabéns pela reflexão e pela coragem de experimwntar e inovar.
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