O desaparecimento da infância,
de Neil Postman, caminha com o leitor por vários cenários e datas – da Grécia
Antiga aos dias atuais – mostrando como a noção de infância foi e é retratada. O
fato é que esse tem sido um tema muito discutido e estudado, e nunca se mostra
arcaico, desatualizado. É importante ressaltar que Postman não aponta “culpados
absolutos” e únicos do desaparecimento da infância, além de não oferecer
soluções para o problema abordado. O autor mostra possíveis causas e evidências
de que a infância está em vias de desaparecer, mas em momento algum cria uma
nova receita a ser seguida para que isso não ocorra.
Na
primeira parte do livro, Postman se atém à Invenção
da Infância, partindo dos gregos e indo até o final do século XIX. Na
Grécia, a infância não era considerada uma etapa especial, e por isso se
prestava pouca atenção às crianças. Isso se reflete nas palavras que se
utilizava para designar uma criança ou um jovem: pode-se dizer que elas são
ambíguas, usadas para se referir a qualquer um que esteja entre a infância e a
velhice. Entretanto, a educação era extremamente valorizada entre eles – apesar
de a noção de escola tida pelos gregos ser diferente da que se tem nos dias
atuais. O fato é que a infância não foi inventada na Grécia, mas essa cultura
nos possibilitou um presságio do que ela viria a ser quando os romanos a
criassem.
Os
romanos, por sua vez, tiveram um olhar um pouco diferente em relação à
infância. Foi quando se estabeleceu uma conexão entre o crescimento da criança
e a noção de vergonha; momento esse em que os romanos acharam necessário
proteger a criança, por exemplo, dos segredos do mundo dos adultos. Tais ideias
viriam a se perder na Idade Média juntamente com o conceito de infância, em que
a criança – aos sete anos de idade – passava a ser um adulto por já conseguir
ler, ter acesso a esse conteúdo. Esse fato é muito importante, pois um mundo
novo de possibilidades é aberto por meio da leitura.
Segundo
Postman, o início do desaparecimento da infância ocorreu com o advento do
telégrafo, em que parte do mundo dos adultos – antes segregado – ficou
disponível em apenas um clique. Como o próprio autor diz “o telégrafo iniciou o processo de tornar a informação incontrolável”.
Assim, as crianças passaram a ter acesso a um tipo especial de informação,
antes apenas acessível aos adultos. Essa
tendência se consolidou com o surgimento da televisão e a democratização ao seu
acesso: “a hierarquia da informação
desmorona” (Postman, 2005, p. 92).
É
inegável o fato de a televisão ser um dos meios de comunicação mais utilizados
pela população – não apenas como fonte de notícia, como também de
entretenimento. Postman não contrapõe a essa verdade. O problema em relação à
“telinha” são os excessos cometidos pelos seus usuários, que frequentemente a
elegem como melhor forma de diversão – seja em família, seja sozinho. Os anos
que se decorrem entre o final do século XX até os dias atuais, são marcados por
uma infância em companhia fiel da televisão. A impressão que se tem é que, em
muitos lares, os pais passaram a ter papel secundário na educação, no lazer e
na formação de seus filhos. A televisão eliminou a exclusividade do conteúdo do
mundo dos adultos – o que rompe o limite entre a infância e a idade adulta,
suas principais diferenças que a caracterizam como sendo uma ou outra.
Essa
revelação rápida e igualitária também surge com a internet. As crianças são
constantemente sobrecarregadas com o excesso de informação vindo dos meios de
comunicação e de outros eletrônicos (vídeo-games; bonecos de ação; bonecas que
falam, andam). O excesso de estímulos visuais e sonoros não é de todo
acompanhado por um progresso no desenvolvimento infantil. Isso pode ser visto
no contexto da leitura dialógica, em que a criança é convidada todo momento a
pensar sobre a estória. Certa vez durante a leitura de Peter Pan, um contador
pediu para que as crianças fechassem os olhos e imaginassem a sua própria Terra
do Nunca, o lar da personagem. Quando perguntadas sobre o que estavam vendo,
muitas verbalizaram um “Não sei, tia! Tá tudo escuro!”.
Os
recursos disponíveis para uma “infância feliz” são bem mais do que antigamente.
Entretanto, a impressão que fica é a de que as crianças estão sendo cada vez
mais modeladas, tendo o padrão de comportamento dito por uma “indústria
infantil”. Não há espaço para que possam criar, imaginar, serem elas mesmas –
serem autênticas. As portas do mundo
estão abertas para o público infantil. Fato. Com a condição de estarem
devidamente vestidos segundo a moda; não correrem, rirem ou falarem alto em
seus corredores; sentarem corretamente diante da mesa; não sujarem a roupa nova
que a mãe comprou; não passarem o tempo “brincando”, porque é preciso
amadurecer logo; lidar com uma rotina cheia de atividades, que se dividem entre
a escola/balé/inglês/natação/espanhol/ violino/aula particular/esgrima;
acostumar-se a ter os pais muito ausentes, porque afinal eles querem te dar uma
vida confortável. Bom, é isso crianças! Sejam bem- vindas, mas não se esqueçam
de limpar os pés antes de entrarem. Seus
pais só chegam mais tarde.
2 comentários:
Obrigada pelo texto, gostei muito! Muito expressivas suas frases finais.
Obrigada! Estava inspirada no dia em que escrevi, indignada com o que vem acontecendo com a infância. Acho que por isso consegui me expressar dessa forma! =D
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